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O que Fibrilação Atrial e Psicoterapia podem ter em comum?
Escrito por
Humberto Graner
Publicado em
18/7/2023
A psicoterapia pode ajudar a controlar os sintomas e melhorar a qualidade de vida de pacientes com fibrilação atrial (FA)? O controle dos sintomas é um componente essencial no tratamento desta arritmia, para além da prevenção de tromboembolismo e prevenção de complicações. Estudos revelam que alguns pacientes que experimentaram início abrupto de sintomas como palpitações, falta de ar, dor no peito e tontura passaram a relatar medo, ansiedade e comportamentos inadequados relacionados ao perigo percebido e imprevisibilidade dos sintomas. Os entrevistados passam a a evitar alimentos, atividades ou situações que acreditam desencadear sintomas percebidos como fibrilação atrial. Eles se tornaram hipervigilantes em busca de sinais e sensações que pudessem sinalizar o início da FA, temendo que estes sintomas possam comprometer a saúde do coração e até mesmo levar à morte. Estes comportamentos estão associados a prejuízo funcional, diminuição da qualidade de vida, aumento da intensidade dos sintomas, e, consequentemente, mais visitas ao pronto-atendimento.
Para abordar os efeitos negativos da preocupação com os sintomas, alguns investigadores avaliaram intervenções cognitivo-comportamentais. Com esta estratégia, benefícios em termos de melhoria da qualidade de vida, diminuição da ansiedade, diminuição da depressão redução dos sintomas de FA foram relatados. No entanto, os estudos até agora são limitadas pela diversidade no tipo de intervenção, instrumentos utilizados, desfechos avaliados, e resultados mistos. Assim, as evidências atuais são insuficientes para orientar a prática rotineira.
Foi publicado no JACC, o primeiro ensaio clínico randomizado conhecido em pacientes com FA paroxística para avaliar o efeito de uma intervenção cognitivo-comportamental realizada online. Este estudo controlado e de único centro avaliou a eficácia de um programa de psicoterapia cognitivo-comportamental (TCC) online de 10 semanas, guiado por terapeuta, em pacientes com fibrilação atrial paroxística sintomática. Os principais componentes foram os relatos de sintomas cardíacos e a redução do comportamento evasivo relacionado à FA. Os pacientes foram avaliados no início, pós-tratamento e no seguimento de 3 meses. O desfecho primário foi a qualidade de vida específica da FA. Os desfechos secundários incluíram o uso de recursos de saúde específicos para FA, e a carga de FA registrada no loop (eletrocardiograma contínuo) de 5 dias.
Os autores descobriram que a TCC levou a uma melhora significativa nos escores de qualidade de vida específicos da FA, bem como a uma redução de 56% no consumo de cuidados de saúde específicos. Särnholm et al afirmam que a magnitude da melhora na qualidade de vida daqueles que receberam a intervenção é comparável às pontuações relatadas em ensaios de clínicos de ablação. É ainda notável que esses resultados tenham ocorrido SEM que houvesse redução na carga de FA medida por 5 dias de monitoramento contínuo.
Esses achados ilustram o potencial da TCC online como uma modalidade de tratamento para melhorar a qualidade de vida e diminuir a utilização de recursos de saúde pelos pacientes com FA paroxística sintomática. Estudos futuros devem explorar a integração da TCC em linhas de cuidado padrão de FA, incluindo avaliação de custos com psicólogos, e identificando aqueles que mais se beneficiam.
Referências:Särnholm J., Skúladóttir H., Rück C., et al. Cognitive Behavioral Therapy Improves Quality of Life in Patients With Symptomatic Paroxysmal Atrial Fibrillation. J Am Coll Cardiol . 2023 ;82:1: 46-56.