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O que a dosagem de PCR pode nos dizer sobre o Risco Residual
Escrito por
Humberto Graner
Publicado em
23/11/2023
Uma análise recente de 31.245 pacientes tratados com estatinas nos estudos PROMINENT, REDUCE-IT e STRENGTH demonstrou que o risco inflamatório residual (avaliado pela PCR ultrassensível) era um preditor mais poderoso de eventos cardiovasculares futuros do que o risco residual de colesterol (avaliado por LDL colesterol). No entanto, nem todos os pacientes podem tolerar a terapia com estatinas, e as relações contemporâneas da PCR-as e do LDL-C com o risco cardiovascular são incertas para aqueles que não tomam estatinas.
O estudo CLEAR Outcomes comparou ácido bempedoico ao placebo em pacientes intolerantes a estatinas com doença aterosclerótica, ou com alto risco para tal. No geral, a incidência do desfecho primário (morte cardiovascular, infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, revascularização coronária) foi significativamente menor no grupo que utilizou ácido bempedoico.
No entanto, esta coorte contemporânea do CLEAR Outcomes permitiu também avaliar as relações contemporâneas de PCR-us e LDL-colesterol com a incidência de eventos cardiovasculares adversos importantes (MACE), mortalidade cardiovascular, e mortalidade por todas as causas.
Em comparação com o placebo, o ácido bempedoico reduziu a mediana de PCR-us em 21,6% e os níveis médios de LDL em 21,1% aos 6 meses.
O maior quartil de PCR-us basal foi significativamente associada a:
- maior desfecho primário composto de MACE - HR 1,43, IC95% 1,24-1,65,
- maior mortalidade cardiovascular - HR,2,00; IC 95% 1,53-2,61, e
- maior mortalidade por todas as causas - HR, 2,21 [IC 95%, 1,79-2,73.
Por outro lado, a relação do quartil de LDL basal (mais alto versus mais baixo) com eventos futuros foi menor em magnitude para o desfecho cardiovascular composto primário (HR 1,19; IC 95% 1,04-1,37) e neutra para mortalidade cardiovascular e mortalidade por todas as causas. Os riscos eram elevados para aqueles com PCR-us elevada, independentemente do nível de LDL. O ácido bempedoico demonstrou eficácia semelhante na redução de eventos cardiovasculares em todos os níveis de PCR-us e LDL.
Essas conclusões da nova análise são quase idênticas aos dados anteriores: que o risco inflamatório residual foi novamente um determinante mais forte do risco de eventos cardiovasculares futuros do que o valor do LDL colesterol.
Take-home message
A mensagem que devemos levar para casa é que não podemos tratar o que não medimos.
Assim como avaliamos universalmente o LDL colesterol e a pressão arterial, deveríamos medir mais frequentemente a PCR-us entre nossos pacientes com aterosclerose para identificar pacientes com risco inflamatório residual que poderiam muito bem se beneficiar de terapia anti-inflamatória direcionada. Por exemplo, o FDA norte-americano aprovou recentemente colchicina em baixas doses (0,5 mg por via oral diariamente) como a primeira terapia anti-inflamatória direcionada para a doença aterosclerótica crônica. Assim, entre os pacientes sem doença renal ou hepática grave (onde a colchicina é relativamente contra-indicada), os médicos têm agora um método comprovado não apenas para reduzir a PCR-as, mas também para reduzir as taxas de eventos devido à inflamação vascular em 25% a 30%.
Dieta, exercícios e cessação do tabagismo diminuem a PCR-us e reduzem as taxas de eventos. Da mesma forma, colchicina em baixas doses, estatinas, ácido bempedoico, agonistas do GLP-1R e inibidores do SGLT2 diminuem a PCR-as e estão associados a riscos mais baixos de eventos cardiovasculares futuros. Como tal, “quanto menor, melhor” parece ser verdade para a inflamação, assim como para o LDL-C.
Referência
Ridker PM, Lei L, Louie MJ, Haddad T, Nicholls SJ, Lincoff AM, Libby P, Nissen SE. Inflammation and Cholesterol as Predictors of Cardiovascular Events Among 13970 Contemporary High-Risk Patients With Statin Intolerance. Circulation. 2023 Nov 6. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.123.066213.