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Hiperinsulinemia ou obesidade: quem vem primeiro?
Escrito por
Luciano França de Albuquerque
Publicado em
27/9/2023
A literatura médica dispõe de dados substanciais sobre a associação entre hiperinsulinemia e obesidade no desenvolvimento de diabetes mellitus tipo 2 (DM2) e aterosclerose.
O aumento da gordura corporal levaria a resistência à insulina. Em resposta, as células beta aumentam sua secreção resultando em hiperinsulinemia, que mantém níveis séricos normais de glicose, pelo menos inicialmente. Com a persistência do processo, a hiperglicemia se desenvolve apenas quando o pâncreas falha em atender a demanda aumentada de secreção de insulina. Tal relação fundamenta o paradigma predominante sobre a história natural do DM2.
Entretanto, a hiperinsulinemia também é condição associada a ganho de peso. Surge a questão de saber quais destes eventos são causa e quais são efeito.
Artigo recém-publicado na JCEM empregou técnica de randomização mendeliana bidirecional para examinar a relação causa-efeito entre obesidade e hiperinsulinemia/resistência à insulina.
Os autores descrevem 520 polimorfismos fortemente ligados ao índice de massa corporal (IMC) que também tinham forte associação com hiperinsulinemia em jejum. Os marcadores genéticos ligados à relação cintura-quadril mantiveram maior associação com a hiperinsulinemia em jejum (2,4 vezes) após ajuste para o IMC, sugerindo um maior impacto da obesidade central na hiperinsulinemia em jejum do que a adiposidade geral. Marcadores em genes específicos para a síntese de insulina nas células beta correlacionaram-se significativamente com o IMC.
Com base nestes achados, os autores reforçam a ideia inicial de que a adiposidade central é determinante no desenvolvimento da resistência à insulina, com hiperinsulinemia compensatória e expansão adicional da massa de tecido adiposo, o que piora ainda mais a resistência à insulina, criando um ciclo metabólico vicioso que leva ao desenvolvimento de DM2.
Por outro lado, estudos em indivíduos magros, saudáveis e com tolerância normal à glicose fornecem evidências de uma relação causa-efeito mútua entre os dois. Pequena elevação na concentração plasmática de insulina produz resistência grave à insulina medida por clamp euglicêmico. O aumento na concentração plasmática de ácidos graxos livres por curto período (4 dias) levou a hiperinsulinemia acentuada sem alteração no peso corporal. Em alguns fenótipos de DM2 em indivíduos magros, o aumento da secreção de insulina pode ser o defeito primário e a hiperinsulinemia resultante pode causar resistência à insulina e obesidade.
Independente da definição de causa ou efeito, estudos clínicos apontam modificações de estilo de vida, com ajuste na dieta, prática regular de atividade física e controle do peso corporal como medidas fundamentais na prevenção ou mesmo remissão do diabetes em fases iniciais. Tais medidas tem eficácia comum tanto na obesidade quanto na hiperinsulinemia, reforçando a necessidade da abordagem integral para pacientes com DM2.