Ticagrelor: o que você precisa saber sobre esta medicação?

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Ticagrelor: o que você precisa saber sobre esta medicação?

O ticagrelor é uma medicação anti-plaquetária que age de forma diferente do clopidogrel e do prasugrel (pertencentes a classe dos tienopiridínicos). Apesar das 3 medicações terem o mesmo mecanismo de ação (inibição do receptor plaquetário P2Y12) o ticagrelor tem efeito reversível enquanto que os tienopiridínicos atuam de forma irreversível.

A medicação foi avaliada no estudo PLATO (Platelet Inhibition and Patient Outcomes) publicado na New England em 2009. Neste trial foram randomizados 18.624 pctes em 43 países diferentes do mundo com síndrome coronariana aguda tanto com quanto sem supra de ST. Os indivíduos eram então randomizados para receber clopidogrel (dose de ataque de 300-600 mg e manutenção de 75 mg) ou ticagrelor (180 mg de ataque e manutenção de 90 mg 2xd) durante 1 ano. Todos os pctes recebiam AAS (75-100 mg/d) a não ser que não tolerassem a medicação. O end-point primário do estudo era o desfecho composto de morte por causas vasculares + AVC + reinfarto tendo ocorrido em 11,7% dos pctes que usaram clopidogrel e em 9,8% dos pctes recebendo ticagrelor (redução de 16%). Os end-points secundários incluíam a análise isolada de morte por causa cardiovasculares, AVCi e IAM. Observou-se DIMINUIÇÃO DE 21% DA MORTALIDADE por causas cardíacas (saiu de 5,1% para 4%) e de 16% do risco de IAM. Não houve diferença de AVC. Para cada 1.000 pctes tratados com ticagrelor ao invés de clopidogrel houve uma diminuição de 14 mortes, 11 infartos e 8 tromboses de stent. Interessante que NÃO HOUVE AUMENTO DE SANGRAMENTOS de uma forma geral com o uso do ticagrelor.

No subestudo do PLATO que analisou os pctes do trial que foram encaminhados para a cirurgia (<5% dos casos) notou-se um dado interessante. Apesar de não ter havido diminuição do risco de sangramento, IAM ou AVC no grupo do ticagrelor, observou-se uma importante diminuição da mortalidade tanto por causas cardiovasculares quanto por causas gerais. Esta redução ficou em torno de 50%. Começou-se a questionar se a droga poderia ter efeitos pleotrópicos que justificassem o achado mas isto ainda será motivo de muito debate.

Um dado interessante é que o fato do ticagrelor ter efeito reversível tem, como tudo na vida, um lado bom e um possivelmente deletério. A principal vantagem da reversibilidade da medicação é provavelmente o fato de poder-se usá-la de forma upstream (já na sala de emergência, antes de realização do cateterismo). Isto porque caso o cate mostre posteriormente que trata-se de caso cirúrgico é só suspender a medicação por 2 ou 3 dias e encaminhar o pcte para o procedimento, sem aumentar assim o seu risco de sangramento. Já quando usa-se o clopidogrel e o prasugrel este período sobre para 5 e 7 dias, respectivamente. Devido a este fato inúmeros serviços optam por administr r o clopidogrel apenas na sala de hemodinâmica, após ter-se descartado que o caso seja de indicação cirúrgica. bem, mas como nem tudo são flores a reversibilidade do ticagrelor pode ter um efeito possivelmente maléfico. Sabe-se que a aderência dos pctes às medicações prescritas está bem longe do esperado. A questão é que com o ticagrelor a omissão de 3 a 4 doses da medicação já pode aumentar bastante o risco de trombose de stent. Já com o clopidogrel só começa a haver aumento significativo do risco de trombose após 3 a 5 dias da suspensão da droga. Ou seja, pctes mal aderentes são um grupo potencialmente complicado para receberem o ticagrelor a longo prazo.

Um outro possível uso do ticagrelor seria como "medicação-ponte" nos pctes que vem em uso de clopidogrel ou prasugrel e precisam ser operados por algum motivo. Explicando melhor: o que fazer com um pcte que colocou um stent farmacológico há 4 meses e descobriu ser portador de neoplasia gástrica necessitando ser submetido a gastrectomia o mais breve possível? Sabemos que nos pctes portadores de stent farmacológico a dupla antiagregação tem que ser mantida idealmente por pelo menos 1 ano. Ao parar-se o clopidogrel por um certo período ocorre um aumento exponencial do risco de trombose de stent. Ironicamente a maioria dos cirurgiões recusa-se a operar pctes em uso de clopidogrel devido ao risco aumentado de sangramentos. O que fazer? Apesar desta pergunta ainda não possuir resposta clara uma alternativa que vem sendo estudada é a possibilidade de se usar um outro antiplaquetáriocomo efeito de ponte entra a suspensão do clopidogrel e a realização da cirugia. Isto já foi feito com antagonistas 2b3a venosos. Suspende-se o clopidogrel 5 dias antes da cirurgia, iniciando-se logo apos o uso de tirofiban. Esta medicação é desligada 4-8 hrs antes da cirurgia. Assim o pcte fica "descoberto" durante curto período de tempo antes do procedimento. O mesmo princípio valeria para o ticagrelor. Suspender-se-ia o clopidogrel 5 dias antes iniciando-se de forma concomitante o ticagrelor. Este por sua vez poderia ser suspenso 2 a 3 dias antes da cirurgia. Este possível efeito do ticagrelor ainda não foi estudado em trials mas isto é questão de tempo.

Não há necessidade ajuste da dose em idosos. Nos pctes >75 anos a medicação não apresentou benefício em relação ao clopidogrel. Não é necessário ajuste pela função renal, contudo, como não foi estudado em pctes dialíticos deve-se evitar o uso de ticagrelor neste subgrupo. O mesmo pode-se dizer de pctes com hepatopatia moderada/grave.

Como havia relato prévio de pausas ventriculares exacerbadas pelo ticagrelor, pctes com risco aumentado de bradicardia sintomática (ex: doença do nó sinusal sem marcapasso implantado, BAV de segundo ou terceiro graus, etc) foram excluídos do PLATO.

Houve aumento de dispnéia com o uso do ticagrelor no PLATO (14,2% dos pctes x 9,2% dos indivíduos que usaram clopidogrel). O motivo disto é desconhecido. 1 em cada 100 pctes do PLATO que usaram o ticagrelor tiveram que parar a medicação devido ao sintoma. Pctes com asma e DPOC têm maior risco de desenvolver dispnéia secundária a droga e assim a medicação deve ser utilizada com cautela nestes casos.

Vale a pena usar o ticagrelor em paciente que teve IAM no passado mas que não está em mais na fase aguda do infarto? Veja este post.Vale a pena administrar o ticagrelor já na ambulância nos casos de IAM com supra de ST? Veja este post.