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Qual a importância do estudo de viabilidade miocárdica? Qual método escolher?
Escrito por
Renata Ávila
Publicado em
28/9/2016
O estudo de viabilidade miocárdica tem se mostrado especialmente útil em pacientes com doença arterial coronariana (DAC) e disfunção ventricular esquerda grave, uma vez que a conduta a ser tomada, revascularização cirúrgica, angioplastia ou tratamento clínico, é diretamente influenciada pela presença ou não de tecido viável.
O termo miocárdio viável refere-se ao tecido com função deprimida, mas que poderá ser recuperada após o restabelecimento do fluxo sangüíneo e engloba diferentes subtipos de tecido: miocárdio atordoado e miocárdio hibernante. O miocárdio atordoado (stunned) é definido como miocárdio que se tornou disfuncional devido a um período transitório de isquemia grave, e que se mantém alterado mesmo após a reperfusão (essa disfunção pode durar de horas a semanas). O stunned traduz-se numa discordância entre a perfusão (normal) e a contractilidade (alterada) miocárdicas. O miocárdio hibernante resulta de uma isquemia crônica e persistente em que, para se adaptar à situação de baixo fluxo o miocárdio diminui o consumo de oxigênio acarretando em disfunção ventricular. Traduz-se numa concordância entre a perfusão e a contratilidade miocárdicas (ambas alteradas). O prognóstico desses pacientes poderá ser melhorado consideravelmente após o restabelecimento da perfusão miocárdica depois da revascularização.
E quais seriam as contribuições dos testes para avaliação de viabilidade miocárdica?
1) ajudar a prever a resposta da revascularização em pacientes selecionados com DAC e disfunção ventricular esquerda, tais como a melhora da motilidade das paredes do ventrículo esquerdo e da fração de ejeção;
2) ser um marcador de prognóstico;
3) influenciar a terapia médica.
E enfim, qual método escolher? Existe um teste superior ao outro? Importante ressaltar que cada método tem suas vantagens e desvantagens, e que a escolha muitas vezes vai além do “melhor método” apenas, tendo que se levar em consideração a disponibilidade local de cada método e as contra indicações específicas de cada paciente para determinado exame. Na atualidade temos alguns métodos de imagem não invasivos, descritos abaixo, que nos permitem a avaliação da viabilidade miocárdica.
- ecocardiografia com dobutamina: avalia a reserva contrátil, tento na resposta bifásica, que refere-se a uma melhora inicial da função contrátil com dobutamina em baixa dose seguida pela deterioração com doses mais elevadas, o achado mais significativo para prever recuperação após revascularização. Apresenta uma elevada especificidade, entretanto baixa sensibilidade em relação aos demais métodos. Pode apresentar limitações na janela acústica e variabilidade interobservador.
- cintilografia miocárdica com tálio 201 (SPECT): a captação inicial do tálio-201 é principalmente determinada pela perfusão regional, enquanto a captação mantida ao longo de um determinado período de tempo, depende da integridade da membrana celular e, portanto, da viabilidade do miócito. Baseia-se na rápida eliminação da substância radioativa da zona normal e numa eliminação mais lenta da zona isquêmica. Apresenta uma adequada sensibilidade, e como limitações, possui uma elevada exposição a radiação, baixa especificidade e limitada resolução espacial.
- tomografia por emissão de pósitrons (PET): permite tanto a avaliação perfusional como a do metabolismo do músculo cardíaco. O marcador utilizado é a amônia marcada (13NH3). A captação de glicose pela célula cardíaca é feita pelo F-18-deoxiglicose (FDG-PET). Apresenta uma elevada sensibilidade e uma especificidade equivalente à ressonância cardíaca e ao SPECT. Como limitações, apresenta exposição a radiação e limitada resolução espacial.
- ressonância magnética cardíaca (RMC): permite tanto a avaliação perfusional (ver este post) como a avaliação da presença e a extensão do realce tardio (fibrose) miocárdico (RT), possui excelente correlação com o dados histopatológicos, adequada sensibilidade e especificidade. A probabilidade de recuperação da contratilidade segmentar correlaciona-se inversamente com a extensão do RT. Portanto, aproxima-se mais da realidade biológica determinando, inclusive, a probabilidade de recuperação da função contrátil de acordo com presença ou não da fibrose miocárdica e da sua em cada segmento cardíaco (ver este post). Ao invés de um laudo dicotômico que sugira apenas presença ou ausência de viabilidade. Deve ser evitada em pacientes com clereance de creatinina < 30 ml/min/1.73 m2 e alguns tipos de “devices” cardíacos. Estudos demostram que a RMC é superior à cintilografia por SPECT e apresenta a mesma sensibilidade e especificidade que o PET para a identificação de áreas de infarto crônico.
A revascularização coronariana em pacientes com miocárdio viável tem melhorado a motilidade das paredes do ventrículo esquerdo, a fração de ejeção, a classe funcional e o prognóstico. O grande desafio é determinar quais pacientes terão benefícios com a intervenção, daí a importância do Estudo de Viabilidade Miocárdica.
Referências:
- Anavekar N.S, Chareonthaitawee P, Gersh BJ, et al. Revascularization in Patients With Severe Left Ventricular Dysfunction. J Am Coll Cardiol 2016;24; 2874–87.
- Wagner A, Mahrholdt H, Parker M, et al. Contrast-enhanced MRI and routine single photon emission computed tomography (SPECT) perfusion imaging for detection of subendocardial myocardial infarcts: an imaging study. Lancet. 2003;361(9355):374-9
- Klein C, Nekolla SG, Haas F, et al. Assessment of myocardial viability with contrast-enhanced magnetic resonance imaging: comparison with positron emission tomography. Circulation. 2002;105(2):162-7.