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Portadores de insuficiência renal podem usar estatinas ?
Escrito por
Giordano Bruno
Publicado em
24/5/2016
A doença renal crônica é considerada condição de alto risco para eventos cardiovasculares, mas infelizmente a utilização de estatinas com a finalidade de prevenir tais eventos não parecem ter a mesma eficácia que nos outros grupos de alto risco. A redução da eficiência destas drogas chega a tal ponto da diretriz brasileira contraindicar o uso em pacientes com insuficiência renal terminal (terapia dialítica).
Os estudos com estatinas nesta população específica são escassos e muitas informações são obtidas através da análise de sub-grupos dos trials tradicionais.
Mas o que podemos concluir das evidências ?
EM PREVENCAO PRIMÁRIA
- Pacientes com doença renal crônica avançada não dialítica devem ter meta de LDL colesterol abaixo de 70 com o uso de estatina (esta é a recomendação da diretriz brasileira, com pouca fundamentação em estudos clínicos e com o agravante do risco de altas doses de estatina nestes pacientes)
- Em relação aos dialíticos, o estudo German Diabetes and Dialysis, incluindo diabéticos que já são considerados de alto risco, não mostrou melhora com uso da estatina do end-point combinado, havendo entretanto melhora do AVC fatal e de todos eventos combinados.
- O estudo AURORA com rosuvastatina 10mg em pacientes dialíticos não demonstrou benefício com o uso da mesma. Como questionamentos do estudo temos:
- A Casuística foi pequena comparada aos principais estudos que orientam estatinas
- Não usou nível de LDL ou outros fatores de risco para incluir os paciente
- O LDL médio era 100, só 20% eram diabéticos, e 10% tinham infarto prévio e após tratamento LDL médio era 60 (muito baixo para pacientes de prevenção primária)
- Não houve diferença nos efeitos colaterais, incluindo hepático e muscular, demonstrando relativa segurança desta terapia.
PREVENÇÃO SECUNDARIA
Dados do estudo PPP (Projeto Pool da Pravastatina que incluiu mais de 19.700 pacientes dos estudos CARE e LIPID) demonstrou benefício da pravastatina em pacientes com ClCr entre 30 e 60 (disfunção moderada), com redução dos eventos e até da mortalidade.
O estudo SHARP publicado em 2001 com 9270 pacientes renais crônicos (destes 3023 em diálise), que tinham história de IAM ou revascularização foram randomizados para sinvastatina 20mg associada a ezetimibe versus placebo, mostrou redução de 17% de eventos cardiovasculares maiores, incluindo infarto, AVC isqueiro e procedimentos de revascularização. Apesar do risco de miopatia ser maior, foi de apenas 2 por 10.000 pacientes tratados por ano. Sem diferenças de hepatite, morte ou câncer.Importante: os resultados não variaram quando consideramos diálise ou não.A maior diferença a favor da estatina foi no grupo com maior nivel de LDL (acima de 119), sendo o beneficio não marcante quando LDL < 77
Subestudo do TNT, demonstrou que 80mg de atorvastatina mantinha superioridade a 10mg da mesma na prevenção secundária de pacientes com disfunção renal leve ou moderada.
Quais são ainda as dúvidas que temos :
- Portadores de aterosclerose subclínica (ateromatose cardíaca ou de outros leitos vasculares) devem ser encarados como prevenção primária ou secundária ?
- Qual seria a dose segura e o nível de LDL ideal para se atingir nestes pacientes ?
Resumindo da ópera:
Na prevenção primária, exceto nos pacientes dialíticos, o uso de estatina deve levar em consideração controles mais rigorosos do LDL-C, pesando os riscos potenciais de eventos adversos maiores nesta população (miotoxicidade, hepatotoxicidade). O uso de doses menores e escalonadas, intensificando medidas não-farmacológicas parece ser uma boa estratégia.
Na prevenção secundária, mesmo em pacientes dialíticos, deve ser feito o uso de estatina, havendo inclusive a opção de usar uma menor dose de sinvastatina associada ao ezetimibe.Apesar das drogas idealmente liberadas serem as eliminadas por via hepática (fluvastatina, atorvastatina, pitavastatina e ezetimibe) muitas vezes as preferidas são aquelas já testadas nos estudos citados acima como sinvastatina (em baixa-dose) e pravastina.