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Lições práticas sobre os mecanismos de ação dos inibidores do SGLT2

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Lições práticas sobre os mecanismos de ação dos inibidores do SGLT2

Os cotransportadores SGLT2 são expressos quase que exclusivamente nos rins. Eles estão presentes na primeira porção do túbulo contorcido proximal e são responsáveis por 90% da glicose reabsorvida nos rins. E os outros 10%? São reabsorvidos pelos receptores SGLT1 presentes nas porções mais distais do túbulo contorcido proximal. A cada molécula de sódio reabsorvida pelos receptores SGLT2, é reabsorvida uma molécula de glicose.

Normalmente, podemos identificar glicosúria quando os níveis séricos de glicose passam de 180 mg/dL. No entanto em indivíduos com DM2, ocorre um up regulation desse cotransportador, fazendo com que glicosúria só ocorra com valores próximos de 250mg/dL. O uso dos inibidores de SGLT2 traz o limiar de excreção renal de glicose para em torno de 80-90mg/dL, fazendo com o que o diabético apresente glicosúria a partir desses valores glicêmicos. Assim, podemos entender que o poder de glicosúria destas medicações é reduzido em pacientes com normoglicemia, bem como que o risco de hipoglicemia com estas medicações é baixo.

Em termos de potência hipoglicemiante, não é das classes mais potentes como metformina ou sulfonilureias, mas reduz a hemoglobina glicada entre 0,5 e 1%.

Além desses efeitos, também resulta numa perda de peso média de 2-3 kg. Esta costuma ocorrer nos primeiros 6 meses de tratamento e depois estabiliza. Qual seria o mecanismo? O mais simples seria explicar pela perda de glicose na urina a qual pode gerar déficit calórico de 200 kcal por dia. Contudo, parece que isso faz com que o indivíduo tenha aumento da fome o que pode fazer com que o efeito de perda de peso não se mantenha a longo prazo. Outros mecanismos possíveis para a perda de peso seriam cetogênese, estímulo à oxidação de ácidos graxos, entre outros.

Outro benefício dos iSGLT2 é que eles provocam uma queda média de 3 a 5 mmHg na PAS, sem contudo aumentar a frequência cardíaca. Um dos mecanismos através dos quais isso ocorre supostamente é a redução do tônus simpático.

Adicionalmente, outro mecanismo potencialmente benéfico dos iSGLT2 é o metabólico. Estas drogas aumentam a metabolização de cetonas e ácidos graxos livres pelo coração o que parece levar a uma melhor eficiência energética. O consumo de corpos cetônicos também parece exercer atividade anti-inflamatória. Esse efeito metabólico associado a maior reabsorção de magnésio e potássio nos rins poderia ser responsável pelo efeito dos iSGLT2 em reduzir morte súbita. A própria hiperglicemia está ligada a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona o qual por sua vez pode causar HVE e fibrose miocárdica. Estudos mostram que os iSGLT2 também podem reduzir essa ativação do SRAA.

E como os iSGLT2 protegem os rins? Ao reduzir a absorção de sódio e glicose no túbulo contorcido proximal, chega mais sódio no túbulo contorcido distal, onde está localizada a mácula densa. Isso faz com que ocorra vasoconstrição da arteríola aferente, o que reduz a pressão intraglomerular. Tal fato é benéfico por reduzir a hiperfiltração glomerular e o stress hemodinâmico causado por esta. A este processo chama-se de feedback túbuloglomerular. Assim como ocorre com inibidores da eca, nas primeiras semanas pode haver uma leve piora da função devido a este reequilíbrio. É reportado uma redução de em média 3 a 5 mL/min/1.73m² neste período. Após isso, a função renal estabiliza e os iSGLT2 reduzem a progressão da nefropatia.

Por fim, como potencial malefício metabólico com uso dessa classe de drogas, temos o achado que os iSGLT2 aumentam o LDL em 3 a 5 mg/dL, em média, mas impacto deste efeito a longo prazo ainda não é bem determinado.

Referência: Zelniker TA, Braunwald E. Mechanisms of Cardiorenal Effects of Sodium-Glucose Cotransporter 2 Inhibitors. J Am Coll Cardiol 2020.