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Exite relação entre atividade de placa aterosclerótica e eventos cardiovasculares?
Escrito por
Humberto Graner
Publicado em
4/10/2023
Eventos coronários recorrentes em pacientes com infarto do miocárdio recente continuam sendo um problema clínico importante. Isso é o que chamamos de risco residual. Por isso, medidas não invasivas da atividade da doença aterosclerótica coronariana teriam o potencial de identificar indivíduos com maior risco.
Um estudo publicado recentemente teve por objetivo avaliar se a atividade da placa aterosclerótica coronariana verificada por exames de imagem não invasivos estaria associada a eventos coronarianos recorrentes em pacientes com infarto do miocárdio.
Trata-se de uma coorte prospectiva multicêntrica internacional, longitudinal, que incluiu 704 pacientes com idade ≥ 50 anos com doença arterial coronariana multiarterial e infarto do miocárdio recente (dentro de 21 dias), com um acompanhamento mínimo de 2 anos.
Foi utilizado o PET com 18F-fluoreto de sódio (18F-NaF), que demonstrou ser um marcador do desenvolvimento de calcificação em placas ateroscleróticas coronárias culpadas após infarto agudo do miocárdio. A idade média dos participantes foi de 63,8 (± 8,2) anos, e a maioria era do sexo masculino (85%). A atividade total da placa aterosclerótica coronariana foi identificada em 421 participantes (60%). Após um acompanhamento médio de 4 anos (IQR, 3-5 anos), 141 participantes (20%) apresentaram o desfecho primário: 9 tiveram morte cardiovascular, 49 tiveram infarto do miocárdio não fatal, e 83 tiveram revascularizações coronárias não programadas.
O aumento da atividade da placa coronariana não foi associado ao desfecho primário (HR 1,25; IC 95% 0,89-1,76; P=0,20) ou revascularização não programada (HR, 0,98; IC 95% 0,64-1,49; P=0,91).
No entanto, maior atividade de placa foi associada ao desfecho secundário de morte cardíaca ou infarto do miocárdio não fatal (47 de 421 pacientes com alta atividade de placa [11,2%] vs 19 de 283 com baixa atividade de placa [6,7%]; HR 1,82; IC95%, 1,07-3,10; P=0,03) e mortalidade por todas as causas (30 de 421 pacientes com alta atividade de placa [7,1%] vs 9 de 283 com baixa atividade de placa [3,2%]; HR 2,43; IC 95% , 1,15-5,12; P = 0,02).
Após ajuste para diferenças nas características clínicas basais, achados da angiografia coronariana e pontuação do GRACE, a atividade elevada da placa coronariana foi associada à morte cardíaca ou infarto do miocárdio não fatal (HR 1,76; IC95% 1,00-3,10; P=0,05), mas não com mortalidade por todas as causas (HR 2,01; IC95% 0,90-4,49; P=0,09).
Como devemos interpretar esses resultados?
Sabemos que a maioria dos infartos do miocárdio são resultado de ruptura de placa, e que o núcleo necrótico aumenta alguns dias após a ruptura ou durante a ruptura da placa. As placas rompidas cicatrizam enquanto o núcleo necrótico se calcifica com o tempo. Foi demonstrado que há maior calcificação em placas rompidas e cicatrizadas do que em placas vulneráveis ou fibroateromas. Portanto, não é surpreendente que a maior atividade de microcalcificação coronária (avaliada pelo flúor marcado) seja maior em pacientes com morte cardíaca e infarto agudo do miocárdio. No entanto, não está claro por que a mortalidade por todas as causas estaria associada a uma atividade microcalcificação mais elevada.
Estes resultados destacam que, embora a atividade da placa coronária detectada através de imagens não invasivas não consiga prever todos os eventos coronários adversos, justifica uma investigação mais aprofundada para a sua associação com resultados específicos, como morte cardíaca ou infarto do miocárdio. Mais do que métodos ultramodernos e novos marcadores, os médicos devem continuar a confiar em fatores de risco tradicionais bem estabelecidos para a redução do risco residual.
Referência
Moss A, Daghem M, Tzolos E, et al. Coronary Atherosclerotic Plaque Activity and Future Coronary Events. JAMA Cardiol. 2023;8(8):755–764. doi:10.1001/jamacardio.2023.1729