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Empagliflozina na hipertrofia do VE
Escrito por
Remo Holanda
Publicado em
29/11/2022
Os inibidores de SGLT2 (sodium glucose co-transporter 2) são medicamentos consagrados no tratamento do diabetes tipo 2 e, mais recentemente, na insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFER), insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP) e insuficiência renal crônica (IRC), com ou sem diabetes (Mais detalhes confira em: https://d3gjbiomfzjjxw.cloudfront.net/emperor-preserved-empagliflozina-em-icfep/.). Além de seu comprovado benefício clínico na redução de hospitalizações por insuficiência cardíaca e progressão de doença renal, muito se discute sobre seu potencial de promover remodelamento reverso do ventrículo esquerdo (VE). Assim sendo, o estudo EMPAHEART já havia mostrado benefício da empagliflozina na regressão da hipertrofia do VE em pacientes com diabetes1. Mas será que esse efeito poderia também ocorrer em não diabéticos?
Para responder a esta pergunta, os investigadores do estudo EMPAHEART-2, publicado no Circulation, randomizaram 169 pacientes sem histórico de diabetes para empagliflozina versus placebo2. O desfecho primário do estudo foi a alteração da massa do VE (em g/m2) pela ressonância, comparando-se entre o basal e 6 meses após o tratamento. Os desfechos secundários foram diâmetro diastólico e sistólico do VE, além de fração de ejeção do VE.
E então? Será que a empagliflozina também poderia atuar na hipertrofia do VE em não diabéticos? Segundo o estudo EMPAHEART-2, não houve diferença estatisticamente significativa na taxa de regressão da hipertrofia do VE entre os grupos empagliflozina e placebo (diferença média entre os grupos -0.30 g/m2; intervalo de confiança [IC] 95% da diferença -2.1 a 1.5 g/m2; P = 0,74). Também não houve qualquer diferença nos desfechos secundários de melhora da fração de ejeção ou dos volumes do VE. De uma maneira geral, a empaglilfozina foi bem tolerada, sem aumento de eventos adversos como desidratação, cetoacidose ou insuficiência renal aguda em relação ao placebo.
E agora? O que extrair desses dados? Diante de um estudo que não encontrou uma diferença estatisticamente significativa, podemos estar diante de duas possibilidades principais. Primeiro palpite: a empagliflozina de fato não apresenta qualquer efeito na na hipertrofia do VE em pacientes sem diabetes, ao contrário dos efeitos benéficos vistos no estudo anterior. A segunda possibilidade é de estarmos diante de um estudo que não teve poder estatístico suficiente para detectar uma diferença, ainda que ela exista e seja clinicamente relevante. Isso geralmente pode ocorrer em virtude de pequeno tamanho amostral, ou grande dispersão dos dados (traduzindo: amostra muito heterogênea). Uma vez que o cálculo amostral do estudo previu uma diferença entre os grupos de 3 g/m2, esta última possiblidade não pode ser descartada (Quer saber mais como ler e entender de maneira adequada qualquer artigo científico? Não deixe de conferir nosso Curso de Medicina Baseada em Evidências: https://lp2.cardiopapers.com.br/mbe-matriculas-perpetuo-vitrine/).
Conclusão: a despeito de seus efeitos avassaladores na prevenção de morte, hospitalização por insuficiência cardíaca e progressão para doença renal terminal, ao que tudo indica, os efeitos dos inibidores de SGLT2, como a empagliflozina, na hipertrofia do VE parecem ser restritos a pacientes com diabetes. Entretanto, vale lembrar que os efeitos benéficos na ICFER e ICFEP, além de IRC com albuminúria, estendem-se aos não diabéticos também. Ainda existem muitos mistérios a respeito do mecanismo de ação dessa classe a serem esclarecidos em futuros estudos.
REFERÊNCIAS
1- Verma S, Mazer CD, Yan AT, Mason T, Garg V, Teoh H, Zuo F, Quan A, Farkouh ME, Fitchett DH, Goodman SG, Goldenberg RM, Al-Omran M, Gilbert RE, Bhatt DL, Leiter LA, Jüni P, Zinman B, Connelly KA. Effect of Empagliflozin on Left Ventricular Mass in Patients With Type 2 Diabetes Mellitus and Coronary Artery Disease: The EMPA-HEART CardioLink-6 Randomized Clinical Trial. Circulation. 2019 Nov 19;140(21):1693-1702. (https://www.ahajournals.org/doi/10.1161/CIRCULATIONAHA.119.042375?url_ver=Z39.88-2003&rfr_id=ori:rid:crossref.org&rfr_dat=cr_pub%20%200pubmed)
2- Connelly KA, Mazer CD, Puar P, Teoh H, Wang CH, Mason T, Akhavein F, Chang CW, Liu MH, Yang NI, Chen WS, Juan YH, Opingari E, Salyani Y, Barbour W, Pasricha A, Ahmed S, Kosmopoulos A, Verma R, Moroney M, Bakbak E, Krishnaraj A, Bhatt DL, Butler J, Kosiborod MN, Lam CSP, Hess DA, Coelho-Filho OR, Lafreniere-Roula M, Thorpe KE, Quan A, Leiter LA, Yan AT, Verma S. Empagliflozin and Left Ventricular Remodeling in People Without Diabetes: Primary Results of the EMPA-HEART 2 CardioLink-7 Randomized Clinical Trial. Circulation. 2022 Nov 6. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.122.062769. Epub ahead of print. (https://www.ahajournals.org/doi/10.1161/CIRCULATIONAHA.122.062769?url_ver=Z39.88-2003&rfr_id=ori:rid:crossref.org&rfr_dat=cr_pub%20%200pubmed)