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Quando um paciente procura um cardiologista devido a arritmia cardíaca, frequentemente é questionado: o senhor(a) toma muito café? O conhecimento de que o café e outros alimentos ricos em cafeína podem causar palpitações vem de longa data e encontra respaldo fisiopatológico já que se trata de uma substância estimulante. Pequenos estudos da década de 80 também atestam este fato. Eu, como arritmologista, escuto, não raramente de meus pacientes, que quando eles exageram no café, o coração dispara.
Porém, quais são as evidências sobre esse tema? Tentando jogar luz nesta questão, Eun-jeong Kim e cols. publicaram um artigo recente no JAMA Intern Med sobre o consumo de café e a incidência de taquiarritmias. Qual foi a conclusão? O consumo habitual de quantidades maiores de café foi inversamente associado a um menor risco de arritmias cardíacas. Isso mesmo, mais café, menos arritmia.
Vamos avaliar esse estudo mais detalhadamente? Foi um estudo de coorte, prospectivo, longitudinal, que avaliou mais de 380 mil indivíduos de um banco de dados no Reino Unido entre janeiro de 2006 e dezembro de 2018. O consumo diário de café era autorrelatado pelos participantes em uma única ocasião. Arritmias como fibrilação atrial, flutter atrial, extrassístoles atriais e ventriculares foram analisadas. A média de idade foi de 56 anos, sendo 52,3% mulheres. Em um seguimento de 4,5 anos, 16.979 participantes desenvolveram arritmias cardíacas. Cada copo adicional de café reduziu em 3% a incidência de arritmias. Em resumo, os indivíduos que não tomavam café tiveram mais arritmias do que aqueles que tomavam 1 copo por dia, que tiveram mais arritmias do que aqueles que tomavam 2 copos e assim sucessivamente, até > 6 copos por dia.
Esse estudo demonstra o oposto do que o senso comum esperaria, porém ele não é uma carta branca para que se prescreva café para os nossos pacientes com palpitações. Ele é uma evidência para que, pacientes que já tomam café, de forma não abusiva, possam manter esse hábito mesmo tendo arritmias cardíacas. E por que isso? Porque esse estudo tem várias limitações metodológicas, a saber: é observacional, o consumo diário de café é baseado em um autorrelato dos participantes em uma única ocasião, ausência de grupo controle etc.
Comentário Cardiopapers:
Essa evidência é importante para não se demonizar o consumo de café em pacientes com arritmias cardíacas. Se o paciente ingere um volume abusivo por dia, ele deve ser orientado a reduzir. Ouça o seu paciente. Ele saberá dizer se após ingesta de café suas palpitações pioram ou não. Isso mostrará a sua sensibilidade ao estimulante.
Mensagem final:
- Se o seu paciente portador de arritmias cardíacas faz uso não abusivo de café, 2 a 3 xícaras por dia, e não percebe piora dos sintomas de palpitações, não proíba o uso.
- Ainda não há evidências robustas o suficiente para se prescrever café nesta população.
- Esse artigo levanta boas hipóteses a serem checadas em um estudo randomizado e com grupo controle.