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Detecção de FA Assintomática Previne Mortes por Eventos Embólicos, Certo? ERRADO!
Escrito por
Pedro Veronese
Publicado em
8/2/2022
A anticoagulação é a medida mais importante para a prevenção de eventos cardioembólicos em pacientes com fibrilação atrial (FA) clínica. Mas qual o conceito de FA clínica? FA clínica, segundo a diretriz Europeia de 2020, é aquela documentada em um eletrocardiograma (ECG) de 12 derivações ou numa tira de ECG com duração de pelo menos 30 segundos. Os dispositivos que monitoram variáveis biológicas, como por exemplo oxímetros, smartphones, aplicativos, relógios, marca-passos, loop recorder implantáveis etc. já são uma realidade no mundo atual. Quanto mais são utilizados, mais detecção de FA ou de suspeita de FA assintomática é feita. Após a detecção por esses dispositivos, se o paciente realizar um ECG de 12 derivações e documentar FA, temos uma FA clínica conforme relatado acima. Não havendo essa documentação, temos uma FA subclínica. E qual a relevância de se diferenciar FA clínica de subclínica?
O racional seria: quanto mais se rastreia FA em pacientes assintomáticos, mais diagnósticos se faz, mais anticoagulação se prescreve e, portanto, mais se protege os indivíduos de eventos cardioembólicos. Mas a história não é bem assim. As evidências demonstram que O BENEFÍCIO LÍQUIDO DE SE ANTICOAGULAR FA SUBCLÍNICA NÃO ESTÁ BEM ESTABELECIDO NA LITERATURA. Isso provavelmente tem relação com a carga de FA, que tende a ser bem maior nos pacientes com FA clínica em relação à FA subclínica, presença de comorbidades diferentes nessas populações etc.
Uma Força-Tarefa americana revisou 26 estudos com 113.784 pacientes. Alguns achados importantes: embora FA aumente substancialmente o risco de AVC, o risco associado à FA subclínica é incerto. Eles não encontraram estudos que relatassem benefícios da terapia anticoagulante em pacientes detectados nessas triagens. Em um editorial, Philip Greenland, MD, ressalta que a conclusão da Força-Tarefa vai de encontro a da Sociedade Europeia de Cardiologia, que endossa a triagem oportunista de FA por palpação de pulso ou tira de ritmo de ECG em pacientes com 65 anos ou mais. Ele recomenda que uma triagem sistemática com ECG para se detectar FA ocorra em indivíduos ≥ 75 anos, ou naqueles com risco elevado de AVC. John Mandrola, em editorial publicado no JAMA, comenta que o monitoramento contínuo por loop implantável no estudo LOOP encontrou 3 vezes mais FA, o que elevou a taxa de anticoagulação oral em 2,7 vezes em comparação ao tratamento padrão. No entanto, não houve diferença estatisticamente significativa na redução de AVC e a redução de 20% nas complicações tromboembólicas no grupo rastreado foi anulada por um aumento relativo de 26% de sangramento maior. O autor levanta uma questão importante para reflexão: quais são os limites para se rastrear uma doença?
Conclusão Cardiopapers:
O benefício líquido da anticoagulação está bem definido na FA clínica, mas não na FA subclínica, muitas vezes detectada pelos dispositivos vestíveis. Neste contexto, a US Preventive Services Task Force concluiu que as evidências atuais são insuficientes para se recomendar a triagem rotineira de FA com ECG em adultos assintomáticos com 50 anos ou mais.
Questões em aberto que devem ser respondidas no futuro:
- Qual a carga de FA que está relacionada com maior risco de AVC?
- Qual a duração da FA que está relacionada com maior risco de eventos embólicos?
- A partir de qual idade pacientes assintomáticos se beneficiariam de rastreamento sistemático?
Bibliografia: