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Paciente de 28 anos, sem comorbidades, chega no pronto socorro com queixa de palpitações e tontura de início há 30 minutos. Apresenta PA 120x80 e saturação de O2 98%. É feito o seguinte ECG na entrada que mostra taquiarritmia com complexo QRS largo.[polldaddy poll=11096276]Resposta abaixo↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓Resposta:
Nota-se uma taquiarritmia com complexo QRS largo, que inicialmente pode nos fazer pensar em taquicardia ventricular, mas algo chama a atenção ao batermos o olho nesse ECG. O intervalo R-R é irregular e os complexos QRS apresentam diferentes morfologias (às vezes mais ou menos alargados). Também não se vê ondas P visíveis.
O ritmo irregular e ausência de ondas P visíveis nos dá o diagnóstico de fibrilação atrial. Os complexos QRS de morfologias distintas (ora mais alargados, ora mais estreitos) com onda delta visível em alguns batimentos nos leva ao diagnóstico de pré-excitação ventricular.
Vale comentar também que em alguns momentos observamos frequências ventriculares em torno de 300 bpm (5 quadradinhos), algo que não seria possível se os estímulos estivessem sendo conduzidos pelo nó AV (lembrem que ele funciona como "freio" dos estímulos que vêm dos átrios para os ventrículos).
Pela morfologia do QRS e onda onda delta, possivelmente estamos diante de uma via posterosseptal esquerda (V1 positivo e II, III e AVF negativos).
Em pacientes com fibrilação atrial na presença de pré-excitação ventricular e resposta ventricular rápida, a cardioversão elétrica sincronizada deve ser a terapia de escolha na emergência, especialmente quando há comprometimento hemodinâmico. E por que fazer cardioversão elétrica se a paciente em questão não apresenta sinais de instabilidade hemodinâmica? Está contraindicado o tratamento com fármacos bloqueadores do nó atrioventricular (por exemplo: adenosina, bloqueadores dos canais de cálcio, betabloqueadores), pois o mesmo funciona como freio dos estímulos elétricos dos átrios para os ventrículos. Normalmente, a condução anterógrada ocorre como uma fusão através do nó AV e da via acessória. Bloquear o nó AV pode facilitar a condução isolada pela via acessória, o que pode permitir frequências ventriculares mais altas. Isso ocorre porque a maioria das vias acessórias tem um período refratário mais curto que o nó AV. O bloqueio nodal AV pode, portanto, ser catastrófico, visto que a condução pela VA pode gerar um aumento da frequência ventricular e possível degeneração em taquicardia ventricular ou fibrilação ventricular!!
Até existem opções de medicações IV a serem feitas na emergência. Pode-se fazer procainamida ou ibutilide IV, já que não fazem bloqueio do nó AV, mas essas medicações não estão disponíveis no Brasil. O uso de amiodarona IV seria a opção de droga a ser usada aqui, mas não há evidências claras que corroborem ou contra indiquem o seu uso.
Lembre-se de que esses pacientes devem ser mantidos internados e sempre ser encaminhados a um serviço que realize acompanhamento e ablação por radiofrequência, que é o tratamento de escolha.
Fonte: Clinical arrhythmology and electrophysiology: a companion to Braunwald’s heart disease / Ziad F. Issa, John M. Miller, Douglas P. Zipes.— 2nd ed.