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Artefatos em tomografia cardíaca – o cego no tiroteio parte I
Escrito por
Alexandre Volney
Publicado em
29/12/2016
Todos os exames complementares em cardiologia apresentam alguns tipo de limitações relacionadas à metodologia em questão que podem de forma direta reduzir a acurácia do método determinando o aparecimento de erros (falsos positivos ou negativos). Um teste ergométrico com linha de base eletrocardiográfica prejudicada durante o exercício pode gerar exames falso positivos; um ecocardiograma realizado em paciente com janela acústica limitada pode impedir a detecção de alteração da contração segmentar do ventrículo esquerdo (falso negativo); uma cintilografia realizada em paciente com distuúrbio de condução do tipo BRE pode determinar achados falso positivos. Assim, na tomografia cardíaca também enfrentamos situações que podem prejudicar a interpretação dos achados, influenciando na acurácia do método. Vejamos, então, quais são os principais artefatos em Tomografia cardíaca e como eles podem influenciar no resultado do exame.
- Blurring
Os artefatos tipo blurring (borramento) já foram apresentados no post sobre a importância do controle da frequência cardíaca. Os aparelhos de tomografia tem uma resolução temporal limitada. Assim, em pacientes com FC elevada, a velocidade de movimentação de determinados segmentos coronarianos (geralmente as porções médio-distais, especialmente da coronária direita) é rápida demais para o tomógrafo "congelar a imagem” deixando-a borrada. A perda de definição das bordas do vaso pode determinar o aparecimento de imagens sugestivas de estenoses que podem não existir (falso positivo). Esse problema pode ser solucionado através de reconstruções de diferentes fases do ciclo cardíaco, interpretando segmento por segmento coronariano. Além disso, a evolução tecnológica dos tomográfos melhorando a resolução temporal tem contribuído para reduzir a prevalência desse artefato.
- Stairstep
A maioria dos tomógrafos utiliza-se de alguns batimentos cardíacos para formar a imagem do coração. Para facilitar o entendimento: um tomógrafo básico de 64 canais adquire em uma volta do tubo 3,2cm de imagem (64 X 0,5mm cada canal); na média um coração normal tem cerca de 12cm de extensão – assim precisamos de dados de no mínimo 4 batimentos diferentes para construir a imagem cardíaca. Para que isso seja perfeito, idealmente a frequência cardíaca deve ser o mais regular possivel, permitindo a aquisição da imagem no mesmo ponto do ciclo cardíaco em batimentos diferentes. Não é díficil, portanto, imaginar o que acontece quando adquire-se imagem de um batimento com ciclo cardíaco (RR) de 1000ms e outro de 600ms - os artefatos tipo stairstep (degrau) determinam o aparecimento de degraus nas imagens, além de borramentos de segmentos específicos – vejam na imagem abaixo o estrago que uma extrassístole pode fazer. Agora imagina em um paciente com fibrilação atrial....
Para corrigir isso lançamos mão de edições no eletrocardiograma, excluindo a utilização de batimentos com RR muito distinto dos demais e/ou aumentando o volume de informação adquirido em batimentos de RR semelhantes. Além disso, reconstruções de fases sistólicas podem atenuar esses artefatos, especialmente nos pacientes com fibrilação atrial.
- Movimentos respiratórios
Não obstante o fato de realizarmos imagens de um órgão em constante movimento, temos também a influência de movimentação da caixa torácica relativa aos movimentos respiratórios. Ok, mas é só pedir para o paciente parar de respirar por cerca de 8 a 10 segundos nos tomografos de 64 canais que está tudo resolvido... claro!, mas não é infrequente a ocorrência de movimentos respiratórios durante o exame em função de ansiedade, desconforto pela injeção do contraste, incapacidade de prender a respiração (pacientes idosos) ou exames com apneia prolongada (estudo de pacientes revascularizados nos quais adquirimos maior extensão do tórax para avaliação dos enxertos).
Os artefatos respiratórios podem ser detectados por movimentos (borramento) de pequenos segmentos cardíacos ou até mesmo pela duplicação de estruturas quando o paciente respirou bastante. A solução é gastar um tempo explicando ao paciente o procedimento diminuindo sua ansiedade, frisando importância em manter a apneia durante aquisição e, as vezes, auxiliando-o diretamente a prender a respiração.
No próximo post, devido sua importância, falaremos exclusivamente do artefato relacionados a presença de calcificação coronariana e outras estruturas radiodensas (stents, marcapassos…). Até lá!