O que você precisa saber sobre Dissecção Coronária Espontânea

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O que você precisa saber sobre Dissecção Coronária Espontânea

Recentemente, descobertas surpreendentes na área da cardiologia estão lançando luz sobre um problema que antes era considerado raro: a Dissecção de Artéria Coronária Espontânea (em inglês, Spontaneous Coronary Dissection Artery – SCDA). Vamos explorar juntos essa condição intrigante de forma mais clara!

A SCDA é um distúrbio que afeta as artérias coronárias, aquelas responsáveis por fornecer oxigênio e nutrientes ao coração. Antes pensávamos que essa condição era incomum, mas agora sabemos que ela é mais frequente do que imaginávamos. Isso abriu portas para estudos mais aprofundados.

O Que Aprendemos?

Nos últimos anos, alguns registros internacionais têm compartilhado suas primeiras experiências em relação à incidência, fisiopatologia e tratamento da SCDA. Dois registros particularmente significativos são o Registro Canadense e o da Mayo Clinic.

No Registro Canadense, abrangendo um total de 750 pacientes, constatou-se que a SCDA não deve ser considerada uma condição benigna. Isto porque 19,9% dos pacientes enfrentaram eventos clínicos em 3,1 anos; e 10,4% tiveram recorrência. A artéria descendente anterior foi a mais acometida, e o risco de ocorrência de eventos isquêmicos combinados nos primeiros 30 dias era em torno de 9,0%.

Já o estudo da Mayo Clinic analisou mais de 1.000 pacientes, revelando que 9,0% dos casos ocorreram durante o ciclo gravídico-puerperal. A artéria mais suscetível também foi a descendente anterior; dissecções múltiplas podem ocorrer em 20,0% dos casos, e a maioria se apresentou como IAM COM supra de ST.

Mulheres têm maior risco para dissecção coronária espontânea?

Para as mulheres grávidas e pós-parto, a SCDA representa um risco maior. Estudos mostraram que o risco de eventos isquêmicos é três vezes maior nesse período. Um estudo detalhado da Mayo Clinic analisou mais de 1.000 pacientes e constatou que 9,0% dos casos de SCDA ocorreram durante o período periparto. Isso frequentemente se apresenta como um tipo específico de ataque cardíaco, chamado de Infarto Agudo do Miocárdio com Supradesnivelamento do Segmento-ST (IAMCSST).

O Cenário Brasileiro

Em nosso Registro Brasileiro SCALIBUR, que englobou 220 casos, observamos uma predominância de 85,0% de mulheres afetadas pela SCDA, com média de idade de 50 anos, muitas das quais não apresentavam ou tinham poucos fatores de risco. A manifestação mais comum da SCDA foi o IAM SEM supra de ST (47,0%), seguido pela variante COM supra de ST (38,0%) e angina instável (12,0%). Ocorrências de choque cardiogênico no momento da admissão foram registradas em 3,0% dos casos, sendo que 50,0% desses afetaram pacientes no período associado à gravidez. Em relação à condução dos casos, 73,5% dos pacientes foram tratados clinicamente, 21,0% foram submetidos à angioplastia, e apenas 0,6% necessitaram de cirurgia de revascularização.

A dissecção coronária teria predisposição genética?

Estudos recentes nos mostraram que a genética também desempenha um papel importante na SCDA. Alguns pacientes possuem variantes genéticas (provavelmente patogênicas e patogênicas) que aumentam o risco dessa condição. Essas variantes podem estar relacionadas a problemas no tecido conjuntivo e a doenças vasculares hereditárias, por exemplo.

Veja uma lista dos principais genes relacionados (Adaptado: Metanálise GWAS – Adlam et al, 2023):

GenesFGGY-DTF3ECM1/ADAMTSL4AFAP1ZNF827ITGA1PHACTR1HTRA1SESN3LRP1ATP2B1COL4A1COL4A2FBN1THSD4MRPS6/SCL5A3/ KCNE2TIMP3

Em suma, a dissecção coronária espontânea, um problema antes considerado raro, está finalmente começando a revelar seus segredos. Estamos percebendo que essa condição é mais comum do que pensávamos, principalmente em mulheres jovens. As pesquisas estão desvendando detalhes cruciais correlacionando dissecção coronariana espontânea e medicina de precisão. Nos últimos cinco anos, ocorreram progressos notáveis em nossa compreensão da base genética subjacente à SCDA, ela pode ser atribuída a variantes genéticas pouco comuns, muitas vezes localizadas em genes associados a condições hereditárias vasculares ou a distúrbios do tecido conjuntivo. Essa situação abrange aproximadamente de 4% a 10% dos pacientes, variando de acordo com os critérios de seleção dos pacientes antes da realização de testes genéticos.

Atualmente, os testes genéticos de rotina não são prática consensual nessa área. Essa abordagem pode ser reconsiderada à medida que mais informações forem disponibilizadas e nosso conhecimento aprofundado. Embora muitas perguntas permaneçam sem respostas definitivas, o conhecimento está evoluindo rapidamente, e num futuro próximo, poderemos contar com estratégias de tratamento mais eficazes para essa condição cardíaca intrigante.

Referências:

Adlam, D., Berrandou, TE., Georges, A. et al. Genome-wide association meta-analysis of spontaneous coronary artery dissection identifies risk variants and genes related to artery integrity and tissue-mediated coagulation. Nat Genet 55, 964–972 (2023). https://doi.org/10.1038/s41588-023-01410-1

Verstraeten A, et al; European/International Fibromuscular Dysplasia Registry and Initiative (FEIRI). Enrichment of Rare Variants in Loeys-Dietz Syndrome Genes in Spontaneous Coronary Artery Dissection but Not in Severe Fibromuscular Dysplasia. Circulation. 2020 Sep 8;142(10):1021-1024. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.120.045946.

Wang Y, Starovoytov A, Murad AM, et al. Burden of Rare Genetic Variants in Spontaneous Coronary Artery Dissection With High-risk Features. JAMA Cardiol. Published online September 14, 2022. doi:10.1001/jamacardio.2022.2970.

Saw J, Starovoytov A, Humphries K, et al. Canadian spontaneous coronary artery dissection cohort study: in-hospital and 30-day outcomes. Eur Heart J 2019; 40:1188.

Tarr I, Hesselson S, Iismaa SE, Rath E, Monger S, Troup M, Mishra K, Wong CMY, Hsu PC, Junday K, Humphreys DT, Adlam D, Webb TR, Baranowska-Clarke AA, Hamby SE, Carss KJ, Samani NJ, Bax M, McGrath-Cadell L, Kovacic JC, Dunwoodie SL, Fatkin D, Muller DWM, Graham RM, Giannoulatou E. Exploring the Genetic Architecture of Spontaneous Coronary Artery Dissection Using Whole-Genome Sequencing. Circ Genom Precis Med. 2022 Aug;15(4):e003527. doi: 10.1161/CIRCGEN.121.003527.