Apenas Procedimentos Dentários podem causar Endocardite? Hora de rever conceitos!

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Falta de ensaios clínicos randomizados controlados sempre tornou difícil estabelecer uma associação direta entre procedimentos invasivos, seja dentários ou não, e o risco de endocardite infecciosa (EI). No entanto, um recente conselho científico da American Heart Association está lançando nova luz sobre esse tema.

Sim, nós tendemos a indicar profilaxia com antibióticos em pacientes de alto risco para endocardite que vão submeter-se a procedimentos dentários, mas NÃO existem ensaios clínicos randomizados prospectivos publicados que tenham: (1) estabelecido uma associação entre procedimentos invasivos odontológicos e não-odontológicos e o risco de endocardite infecciosa; ou (2) definido a eficácia e segurança da profilaxia antibiótica administrada no contexto de procedimentos invasivos na prevenção de endocardite infecciosa em pacientes de alto risco.

No entanto, investigações recentes com grandes bancos de dados de países europeus demonstraram uma associação entre procedimentos invasivos não dentários e o subsequente desenvolvimento de endocardite infecciosa (em particular, em pacientes de alto risco com endocardite infecciosa). Isso motivou o desenvolvimento de um documento científico chamando a atenção para o problema.

É Necessário Rever Conceitos

O conselho científico da AHA analisou oito estudos que avaliaram o risco de EI após procedimentos invasivos não-dentários (PIND). Duas dessas pesquisas se destacaram e instigaram a necessidade de rever conceitos. Ambos os estudos contaram com dados de grandes coortes internacionais para eliminar preocupações sobre o tamanho inadequado da amostra.

Risco de Endocardite é Elevado Também Após Procedimentos Comuns

As investigações apontaram para um risco aumentado de desenvolvimento de EI em pacientes classificados como de "alto risco para endocardite" após vários procedimentos invasivos não dentários, incluindo implante de dispositivos eletrônicos ​​cardíacos, endoscopia gastrointestinal e broncoscopia. Embora esses estudos tenham algumas limitações, os esforços substanciais foram feitos para excluir a probabilidade de os procedimentos serem realizados como parte do diagnóstico ou tratamento da EI.

Implicações na Prática Clínica

Os resultados têm implicações diretas na prática clínica. Primeiramente, destacam a necessidade de educar os médicos sobre o risco potencial que esses procedimentos representam para pacientes com alto risco de EI. Isso se torna especialmente importante em procedimentos que envolvem a inserção repetida ou prolongada de cateteres transcutâneos, onde a atenção meticulosa à esterilidade é crucial. O uso repetido ou de longo prazo de antibióticos para reduzir o risco de EI associado a esses procedimentos é impraticável e tem sido associado à promoção de resistência a antibióticos entre cepas colonizadoras.

Em segundo lugar, a necessidade de alertar médicos sobre a possibilidade de ocorrência de EI em indivíduos de alto risco após procedimentos invasivos não dentários. Esse alerta é importante para garantir o diagnóstico e tratamento mais precoces possíveis de EI em indivíduos de alto risco, a fim de obter resultados de tratamento ótimos. Já que ensaios clínicos randomizados provavelmente não são viáveis, em grande parte devido à baixa incidência de endocardite comparado ao volume de procedimentos realizados no mundo, estudos observacionais de alta qualidade e grande escala são essenciais para ajudar a validar diretrizes relacionadas ao manejo de de pacientes de alto risco de endocardite infecciosa.

Resumindo...

Em resumo, as novas descobertas sugerem que é hora de reavaliar os conselhos sobre a prevenção de endocardite infecciosa, particularmente em pacientes considerados de alto risco.

Para saber mais:

Baddour LM, Janszky I, Thornhill MH, et al; American Heart Association Council on Lifelong Congenital Heart Disease and Heart Health in the Young (Young Hearts) and Council on Cardiovascular and Stroke Nursing. Nondental Invasive Procedures and Risk of Infective Endocarditis: Time for a Revisit: A Science Advisory From the American Heart Association. Circulation. 2023 Oct 5. doi: 10.1161/CIR.0000000000001180. Epub ahead of print.