Compartilhe
Alopurinol não ajuda a prevenir eventos cardiovasculares na DAC crônica
Escrito por
Humberto Graner
Publicado em
30/9/2022
O estudo ALL-HEART1, apresentado no Congresso Europeu de Cardiologia de 2022, falhou em demonstrar redução de eventos cardiovasculares com alopurinol na DAC crônica.O que diziam as evidências:
- Estudo menores já revelavam que o alopurinol reduzia o risco de doença aterosclerótica, provavelmente devido aos seus efeitos sobre radicais livres de oxigênio e na função endotelial.
- Na angina estável, o alopurinol aumenta o tempo médio para depressão do segmento ST, tempo para dor torácica e tempo total de exercício no teste de esforço2.
- Em outro estudo observacional, a medicação pareceu reduzir AVC e eventos cardiovasculares isquêmicos em pacientes com hipertensão arterial. (Veja mais https://d3gjbiomfzjjxw.cloudfront.net/alopurinol-tem-o-potencial-de-reduzir-o-risco-cardiovascular/)
- No entanto, faltavam dados de ensaios clínicos randomizados com desfechos "duros".
Como foi o estudo:
- Ensaio multicêntrico, prospectivo, randomizado, duplo-cego, conduzido no Reino Unido.
- Foram incluídos 721 pacientes com idade 60 anos e portadores de DAC. A idade média foi de 72 anos, e 75% eram homens. Eles foram randomizados para receberem alopurinol 600mg/dia (ou 300mg se DRC leve a moderada), ou placebo, além do tratamento padrão guiado por diretrizes.
- Foram excluídos pacientes com história de gota, insuficiência renal grave (TFGe <30ml/min), IC sintomática moderada a grave (NYHA III-IV), e doença hepática grave.
- Os pacientes foram acompanhados por 4,8 anos, em média.
E quais foram os principais resultados?
- O desfecho primário composto (morte cardiovascular, infarto do miocárdio não-fatal ou AVC não-fatal) foi similar entre os dois grupos.
- Também não houve diferença em nenhum dos desfechos secundários, e a análise de subgrupos não apontou nenhuma característica que pudesse ter feito diferença.
- Interessantemente, 9% dos pacientes do grupo alopurinol abandonaram o estudo (contra apenas 2,6% no grupo placebo), e mais de 57% dos pacientes do grupo tratamento interromperam a medicação.
Comentários:
- O ALL-HEART foi o primeiro e único grande estudo randomizado que analisou o efeito do alopurinol em desfechos cardiovasculares “duros” na DAC crônica, e deve ser a resposta definitiva neste cenário.
- Estes resultados sinalizam (como em estudos prévios), que é cada vez mais difícil apostar unicamente na capacidade antioxidante de certas medicações, quando o paciente já faz uso de uma combinação de drogas eficientes em mudar a história natural da doença.
- A conclusão dos próprios autores endossa que o alopurinol não deve ser recomendado para prevenção secundária de eventos na DAC crônica. Embora outros caminhos possam ser explorados no futuro, como, por exemplo, uma população mais jovem e com aterosclerose ainda incipiente.
REFERÊNCIAS:1- Apresentado pela Dra. Isla Shelagh Mackenzie no Congresso da Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC 2022), Barcelona, Espanha, 27 de agosto de 2022.2- Noman A, Ang DS, Ogston S, Lang CC, Struthers AD. Effect of high-dose allopurinol on exercise in patients with chronic stable angina a randomised, placebo controlled crossover trial. Lancet. 2010; 375(9732): 2161-7. https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(10)60391-1/fulltext