5-fluorouracil aumenta realmente o risco de infarto agudo do miocárdio?

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O quimioterápico 5-fluorouracil é uma fluoropirimidina, um agente quimioterápico utilizado para tratamento de diversos tipos de cânceres como: câncer do trato gastrointestinal, mama, colorretal, cabeça e pescoço, entre outros. Os efeitos adversos cardiovasculares mais comuns do 5-fluorouracil são dor torácica que podem ou não representar um quadro de infarto agudo do miocárdio. Manifestações menos frequentes são: fibrilação atrial, miocardite ou pericardite, insuficiência cardíaca e até óbito decorrente de um infarto agudo do miocárdio. Fatores que podem preceder essas complicações são vasoespasmo coronariano resultando em injúria endotelial e do cardiomiócito. Outras drogas usadas na oncologia também podem causar isquemia miocárdica (vide figura abaixo).

A incidência de isquemia miocárdica relacionada ao uso das fluoropirimidinas é controversa. Um estudo dinamarquês publicado recentemente avaliou o risco de infarto agudo do miocárdio (IAM) em pacientes com câncer do trato gastrointestinal (GI) tratados com 5FU. O estudo incluiu 30.870 pacientes (46.4% mulheres, idade média 65 anos), dos quais 10.290 pacientes possuíam câncer GI tratados com 5FU e 20.580 foram do grupo controle.

A incidência cumulativa de infarto em 6 meses foi maior no grupo que utilizou o 5-fluorouracil 0,7% comparados com 0,3% da população geral, com risco de óbito de 12,1% no grupo 5FU vs 0,6% no grupo controle. A incidência cumulativa de IAM em 12 meses foi de 0,9% no grupo 5FU e 0,6% no grupo controle, com risco de óbito de 26,5% no grupo 5FU vs 1,4 % no grupo controle.

Em relação ao tempo para o infarto agudo do miocárdio, 55,4% dos casos de IAM ocorreram dentro de 5 dias da administração do 5-fluorouracil e 75,4% dentro de 1 mês da administração do quimioterápico. Pacientes com antecedentes de doença coronária (DAC) apresentaram um risco significantemente maior (1,8% maior em 1 ano, p = 0,014) de apresentar algum evento quando comparados com aqueles sem antecedentes. A mortalidade cardiovascular em 180 dias foi de 0,26% no grupo controle, 1,55% no grupo 5FU em pacientes sem antecedentes de DAC e 3,15% em pacientes com antecedentes de DAC. Apesar do aumento absoluto do risco de IAM ter sido modesto, impacta em um risco significante maior na mortalidade.

Essa é a maior análise publicada sobre a incidência de IAM em pacientes recebendo 5FU para tratamento de câncer GI. O estudo tem alguns pontos fortes como: a amostra elevada de pacientes, a demonstração do tempo do IAM após o uso de do agente e o impacto de DAC preexistente como um fator de risco importante para a ocorrência de um novo evento. Entretanto, o estudo apresentou algumas limitações importantes principalmente a não descrição da dose e o modo de administração do 5FU e o papel dos outros agentes quimioterápicos administrados concomitantes ao 5FU durante o tratamento.

O estudo marca uma melhora no entendimento da cardiotoxicidade secundária 5FU com um aumento de 6 -12 meses do risco de IAM.

Referências

https://www.medscape.com/viewarticle/965416#vp_2

Jan Walter Dhillon Shanmuganathan, Kristian Kragholm, Bhupendar Tayal, Christoffer Polcwiartek, Laurids Ostergaard Poulsen, Tarec Christoffer El-Galaly, Emil Loldrup Fosbøl, Maria D’Souza, Gunnar Gislason, Lars Køber, Morten Schou, Dorte Nielsen, Peter Søgaard, Christian Tobias Torp-Pedersen, Mamas A. Mamas, Phillip Freeman, Risk for Myocardial Infarction Following 5-Fluorouracil Treatment in Patients With Gastrointestinal Cancer: A Nationwide Registry-Based Study, JACC: CardioOncology, Volume 3, Issue 5,2021, Pages 725-733.

Giorgio Minotti, Massimiliano Camilli,Risk of Myocardial Infarction in Patients Treated With 5-Fluorouracil: Balancing the Evidence With Black Boxes . JACC: CardioOncology,Volume 3, Issue 5,2021,Pages 734-736.