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Parada cardiorrespiratória na gestante, uma ressuscitação para duas vidas (ou mais!)
Escrito por
Alexandre Lucena
Publicado em
25/11/2018
A parada cardiorrespiratória (PCR) em gestantes é sempre um grande desafio. A identificação das causas, as mudanças hemodinâmicas adaptativas a gestação e o tempo de decisão médica para retirada do feto fazem da PCR na gestante um momento de grande ansiedade para o médico e alta mortalidade para mães e fetos. Baseado nisso, a AHA em 2015 publicou um Statement e o ACLS em 2017 fez uma revisão sobre as particularidades da PCR em gestantes para a capacitação multiprofissional e padronização do atendimento.
DICA:
- As principais causas de PCR em gestantes no mundo são a Hipertensão (eclâmpsia – AHC hemorrágico), hemorragia e sepsis.
Outras causas como as cardiopatias (congênitas em países desenvolvidos e reumáticas em países em desenvolvimento), vasculares (TEP / IAM / dissecção de aorta), anafilaxia e efeito de drogas (como sulfato de magnésio) também são relevantes e devem ser sempre lembradas.
Alterações fisiológicas hemodinâmicas adaptativas a gestação:
- Após 32 semanas, a posição de decúbito lateral esquerdo (DLE) favorece o retorno venoso com aumento da FE em 11%, volume diastólico final 21%, o débito cardíaco aumenta 24% e o volume sistólico 35%;
- No termo, o fluxo útero placentário recebe 1000ml/min chegando a 20% do débito cardíaco;
- O consumo basal de oxigênio se eleva em 20 – 33% pelo aumento do metabolismo/feto;
- A capacidade respiratória diminui 10 – 15% pela elevação do diafragma e crescimento do útero;
- A progesterona causa edema de mucosas e pregas vocais (dificulta intubação orotraqueal) e relaxa o esfincter gastroesofágico inferior predispondo broncoaspiração.
Recomendações durante a PCR:
- As recomendações da massagem cardíaca externa, garantir vias aéreas, desfibrilação e cuidados pós-parada são as mesmas de não gestantes.
- Durante a RCP o útero deve ser deslocado ≥ 15º para esquerda para diminuir a compressão aortocaval e melhorar a hemodinâmica materna.
- Oxigênio é fundamental – ofertar rapidamente e sempre 100%. Hipoxemia deve ser lembrada sempre como possível causa da PCR.
- A AHA recomenda que se use as drogas para RCP de forma igual a não gestantes, sem preocupação com teratogenicidade. Uma exceção é a vasopressina, que deve ser evitada por seus efeitos deletérios uterinos.
- A cesárea deve ser realizada sempre no mesmo local de atendimento da PCR. O tempo ótimo de decisão sobre a cesárea perimortem é até 4 minutos de RCP e o feto deve ser retirado em até 5 minutos. A retirada do feto melhora a hemodinâmica materna e aumenta a chance de sucesso na RCP.
- Não é consenso, mas gestantes em PCR com menos de 24 semanas de gestação tem menos benefício da cesárea perimortem, nesta fase a chance de sobrevivência fetal é menor e não há grandes repercussões hemodinâmicas da gestação sobre a mãe.
Um fato importante é que se estima em 40% as PCR em gestantes seriam de causas evitáveis. A identificação precoce dos sinais perigo e uma rotina segura de hospitais com maternidade para estabelecer protocolos para TEV direcionados a gestantes, assim como protocolos para hemorragia, pre-eclâmpsia / Eclâmpsia e sepsis são passos fundamentais para redução desses eventos catastróficos.