Trombose de prótese mecânica: o que fazer?

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A via final das valvopatias de grau importante acaba por ser a intervenção e, na maioria das vezes, implante de uma prótese valvar, seja biológica ou mecânica. É costume nos referirmos a isso como uma correção da valvopatia, mas, certamente, o paciente passa a ser portador de uma outra comorbidade, a prótese implantada. Seja a preocupação de deterioração, inerente aos dispositivos biológicos, seja o risco de fenômenos trombóticos e hemorrágicos mais encontrados nos dispositivos mecânicos, essa estreita balança tem que ser decidida junto do paciente, para entendermos quais os riscos correr para termos o melhor benefício possível. Especificamente em próteses mecânicas, a trombose é uma complicação a ser evitada, mas, quando ocorre, poucos dados estão disponíveis na literatura e basicamente temos dois tipos de procedimentos: a reabordagem cirúrgica com troca da prótese e a trombólise, cada uma com seus riscos.

Atualmente, as diretrizes mais difundidas sobre o assunto são controversas. A norteamericana coloca a infusão lenta de trombolítico como primeira alternativa, enquanto a mais recente, a europeia, orienta a reabordagem cirúrgica como primeira alternativa para trombose de prótese mecânica obstrutiva do lado esquerdo (mitral e aórtica), mas os relatos trazem um risco de mortalidade bem elevado, de quase 20%. O que diz a diretriz da SBC sobre o assunto? Aí vai o mapa mental retirado do nosso livro Mapas Mentais para a prova de título de cardiologia:

Baseado nessas elevadas taxas de complicações cirúrgicas, um grupo de pesquisa turco publicou um paper no JACC em que comparou ambas as terapias em pacientes com trombose de prótese mecânica do lado esquerdo, estabelecendo como endpoint primário mortalidade em 3 meses e secundário, complicações maiores no mesmo período.

Foram 158 pacientes incluídos, sendo 83 submetidos a trombólise. A taxa de sucesso do tratamento trombolítico foi de pouco mais de 90% com dose mediana de rtpa de 59mg. Oito casos tiveram complicações maiores como embolia coronariana ou periférica de grande volume e sangramento grave, incluindo de sistema nervoso central. A grande maioria dos pacientes submetidos a trombólise utilizaram infusão ultralenta, ou seja, durante 24 horas. Já quando observamos o braço de abordagem cirúrgica, a taxa de complicações foi bem maior. Mais de 62% dos pacientes tiveram alguma complicação, chamando atenção para sangramentos.

A grande diferença dos métodos está na análise da mortalidade. Enquanto 2,4% dos pacientes submetidos a trombólise morreram, 18,7% dos pacientes abordados cirurgicamente evoluíram para óbito, sendo a grande maioria ainda durante a internação. As variáveis que mais se correlacionaram com esse desfecho no grupo cirúrgico foi disfunção sistólica do ventrículo esquerdo e abordagem de urgência.

Chama atenção, inclusive, que quadros de novas tromboses dentro dos primeiros 3 meses foi maior no grupo cirúrgico (6,7% contra 2,4%).

Esse estudo recentemente publicado traz baixas incidências de fenômenos embólicos nos pacientes submetidos a trombólise, discordando de algumas metanálises publicadas previamente, que mostravam um risco aumentado desse desfecho.

Uma crítica que pode apontar para um viés nesses achados é que não houve uma padronização da técnica cirúrgica empregada e, por ser multicêntrico, diversos serviços participaram, cada um com suas respectivas peculiaridades.

Embora os pacientes que receberam infusão ultralenta de trombolítico tiveram resultados superiores, é importante notar que os dados coletados se referem aos desfechos de curto prazo, embora a maior parte das complicações realmente aconteçam nesse período após o evento.

Até o momento, a decisão por qual terapêutica a seguir deve ser ditada pela experiência do centro e por decisão colegiada de Heart Team, mas um dado importante vem à tona: o que antes era quase uma contraindicação, hoje nos mostra que a trombólise do lado esquerdo pode ser segura se bem indicada e reduzir as complicações nesse perfil grave de pacientes.