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Tirzepatida na redução de gordura intramuscular

Escrito por
Luciano Albuquerque
Publicado em
19/5/2025

Na endocrinologia, o manejo do diabetes tipo 2 e da obesidade frequentemente envolve tratamentos que não apenas controlam os níveis de glicose no sangue, mas também abordam a composição corporal, especialmente a distribuição de gordura e massa muscular. Um estudo publicado recentemente na revista The Lancet, o SURPASS-3 MRI, trouxe novas evidências sobre como o tirzepatide, um agonista duplo dos receptores GIP e GLP-1, afeta a composição muscular em indivíduos com diabetes tipo 2.
O SURPASS-3 foi um estudo de fase 3, randomizado, aberto, que comparou os efeitos do tirzepatide em diferentes doses (5 mg, 10 mg e 15 mg) versus insulina degludeca em pacientes com diabetes tipo 2 que estavam em tratamento com metformina, com ou sem um inibidor de SGLT2. O subestudo MRI focou especificamente nas mudanças na composição muscular da coxa, utilizando tecnologia de ressonância magnética para medir com precisão o volume muscular e a infiltração de gordura, a temida mioesteatose.
Principais Achados sobre a Composição Muscular
1. Redução da Gordura Intramuscular
Um dos achados mais notáveis foi a redução significativa na infiltração de gordura muscular com o tratamento com tirzepatide. Altos níveis de gordura intramuscular estão associados à resistência à insulina e a um maior risco de complicações metabólicas no diabetes tipo 2. Notavelmente, as reduções na gordura intramuscular com tirzepatide foram maiores do que o esperado apenas pela perda de peso, sugerindo um efeito específico do medicamento na melhoria da qualidade muscular.
2. Mudanças no Volume Muscular
O tratamento com tirzepatide foi associado a uma diminuição no volume muscular. Os resultados foram comparados com um grande banco de dados populacional, buscando indivíduos com avaliaçao muscular por ressonância magnética. Tal comparação evidenciou que a redução do volume muscular foi consistente com o que seria esperado a partir da perda de peso. Em contraste, o tratamento com degludeca resultou em um pequeno aumento no volume muscular, mas não afetou a infiltração de gordura muscular, destacando a diferença entre os tratamentos.
Análises de subgrupos mostraram que, embora participantes femininas e mais velhas (≥60 anos) tenham experimentado maiores reduções de peso corporal com tirzepatide, não houve diferenças significativas nas mudanças na composição muscular com base em sexo, idade ou características musculares basais. Correlações significativas foram observadas entre a mudança de peso e as alterações no volume muscular, escore Z de volume muscular e infiltração de gordura muscular em participantes tratados com tirzepatide, indicando que as mudanças musculares estavam amplamente associadas à perda de peso.
Implicações para o Cuidado dos Pacientes
A redução da gordura intramuscular é particularmente importante porque pode melhorar a sensibilidade à insulina e a saúde metabólica geral. No diabetes tipo 2, onde a resistência à insulina é uma característica central, diminuir a gordura dentro do tecido muscular pode levar a um melhor controle glicêmico e menor risco de complicações. Além disso, manter a massa muscular durante a perda de peso é crucial para preservar a função física e a taxa metabólica, que podem ser comprometidas com uma perda de peso significativa
A miosteatose não está associada apenas à resistência à insulina, mas também a um risco elevado de complicações cardiovasculares. Pesquisas indicam que a gordura intramuscular contribui para aterosclerose, inflamação sistêmica e disfunção endotelial, todos fatores que aumentam a probabilidade de eventos cardiovasculares graves, como infarto do miocárdio e insuficiência cardíaca. Embora o estudo não tenha avaliado diretamente desfechos cardiovasculares, esses achados abrem caminho para futuras investigações sobre o impacto do tirzepatide na prevenção de eventos cardiovasculares.
Embora o subestudo SUPRAS-3 MRI traga insights valiosos, as limitações são evidentes. Não foram avaliados desfechos funcionais, como força muscular, mobilidade ou desempenho físico. Pesquisas futuras devem investigar se as mudanças na composição muscular se traduzem em melhorias nessas áreas. Além disso, estudos de longo prazo são necessários para entender os efeitos sustentados do tirzepatide na saúde muscular, nos desfechos cardiovasculares e na saúde geral dos pacientes.