Tirzepatida: evidências de eficácia metabólica no LADA

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O Diabetes Latente Autoimune do Adulto (LADA) representa uma forma heterogênea de diabetes que combina aspectos do tipo 1 e do tipo 2. Embora inicialmente possa se apresentar com fenótipo semelhante ao diabetes tipo 2 (DM2), a presença de autoanticorpos, especialmente anti-GAD (GADA), prediz deterioração progressiva da função β-pancreática e maior probabilidade de necessidade precoce de insulinoterapia. Diante disso, cresce o interesse em compreender como medicamentos mais recentes, com ação combinada no eixo incretina, poderiam beneficiar esse subgrupo.

Estudo recentemente publicado no JCEM, representa a primeira análise do uso de tirzepatida em pacientes com DM2 clinicamente diagnosticado, mas GADA-positivos — ou seja, indivíduos com provável LADA. Trata-se de uma análise post hoc, baseada em dados agrupados dos estudos SURPASS 2, 3, 4 e 5, com o objetivo de avaliar se os efeitos metabólicos da tirzepatida se mantêm mesmo na presença de autoimunidade.

Foram incluídos 3.791 participantes com status GADA confirmado: 3.671 GADA-negativos (96,8%) e 120 GADA-positivos (3,2%). A intervenção consistiu em tirzepatida administrada semanalmente nas doses de 5, 10 ou 15 mg. Os desfechos primários foram mudança em HbA1c e peso corporal. Foram também avaliados: função β-pancreática (via HOMA2-B), resistência à insulina (HOMA2-IR) e hipoglicemia.

A positividade para GADA foi definida por níveis ≥5 UI/mL, e os pacientes foram estratificados em GADA baixo (5–200 UI/mL) ou alto (>200 UI/mL).

Controle glicêmico:
A tirzepatida promoveu redução significativa da HbA1c tanto em GADA-positivos quanto em GADA-negativos:

  • GADA-positivo: –2,11%
  • GADA-negativo: –2,32%
    Ou seja, eficácia glicêmica da tirzepatida é preservada em pacientes com autoimunidade insular.

Redução de peso:
A perda ponderal foi substancial e semelhante entre os grupos:

  • GADA-positivo: –9,2 kg
  • GADA-negativo: –9,6 kg (p = 0,588)
    Não houve diferença significativa entre os subgrupos.

Função β e resistência insulínica:

  • O HOMA2-B basal era significativamente menor nos GADA-positivos, refletindo disfunção β-pancreática associada à autoimunidade.
  • Ainda assim, a tirzepatida aumentou significativamente o HOMA2-B em ambos os grupos, embora de forma mais modesta nos GADA+ (62,4% vs 97% de aumento; p = 0,002).
  • O HOMA2-IR foi significativamente menor no basal nos GADA+, com redução proporcionalmente maior após o tratamento com tirzepatida (–27,2% vs –16,9%; p = 0,023).

Hipoglicemia:
Eventos de hipoglicemia (glicemia <54 mg/dL ou grave) foram mais comuns nos GADA-positivos (10%) do que nos GADA-negativos (4,1%). Importante destacar que a maioria dos eventos em GADA+ ocorreu em pacientes que também usavam insulina. Nenhum caso de hipoglicemia grave foi relatado nesse subgrupo.

Por se tratar de uma análise post hoc, o estudo apresenta limitações relevantes:

  • A positividade para GADA foi avaliada retrospectivamente, e o fenótipo clínico de LADA não foi confirmado prospectivamente.
  • A amostra de GADA-positivos é pequena (n = 120), o que limita o poder estatístico e a generalização dos achados.
  • Faltam dados sobre outros autoanticorpos e sobre a evolução da necessidade de insulina a longo prazo.

Esta análise post hoc sugere que a tirzepatida mantém seus efeitos metabólicos benéficos em pacientes com DM2 e autoimunidade  (GADA+), com reduções significativas em HbA1c e peso corporal, melhora de sensibilidade à insulina e discreta preservação da função β. Estudos prospectivos com amostras maiores e desfechos clínicos de longo prazo são necessários para definir o papel definitivo da tirzepatida no manejo do diabetes autoimune do adulto.

Referência: Peters AL, Buzzetti R, Lee CJ, Pavo I, Liu M, Karanikas CA, Paik JS. Improved HbA1c and body weight in GADA-positive individuals treated with tirzepatide: a post hoc analysis of SURPASS. J Clin Endocrinol Metab. 2025;110(4):e962–e969. doi:10.1210/clinem/dgae372