Suplementos de Cálcio: O Vilão Silencioso para Pacientes com Diabetes?

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A suplementação de cálcio tem sido associada a preocupações com a calcificação das artérias. No entanto, nenhuma evidência clara de eventos adverso graves ou efeitos sobre a mortalidade foi demonstrada.

Para o bem ou para o mal, todo agente calciotrópico tem ações vasculares, e vários estudos forneceram evidências das relações entre o metabolismo mineral e a biologia das doenças vasculares. Por isso, o impacto dos suplementos orais de cálcio no risco de doenças cardiovasculares (DCV) tem sido debatido há quase duas décadas. Estima-se que quando obtemos muito cálcio de uma só vez, ele satura o cálcio sérico, levando a depósitos arteriais e a um maior risco de aterosclerose. A absorção mais lenta e ritmada através da dieta não foi associada a este risco.

Qual a novidade agora?

Um novo estudo utilizou dados do UK Biobank para avaliar 434.374 indivíduos acompanhados por um período entre 8 e 11 anos. Os autores categorizaram os pacientes entre aqueles com diabetes e aqueles sem diabetes, e compararam o risco cardiovascular e a mortalidade naqueles que tomavam suplementos de cálcio regularmente versus aqueles que não o faziam. Foram controladas inúmeras variáveis de confusão, e realizadas diversas análises de sensibilidade.

Não houve associação com o risco em não diabéticos, mas os diabéticos que tomavam regularmente suplementos de cálcio tiveram um aumento de:

  • 34,0% na incidência de doença cardiovascular (HR, 1,34);
  • 67,0% na incidência de morte por doença cardiovascular (HR, 1,67);
  • 44,0% na mortalidade por todas as causas (HR, 1,44).

É importante ressaltar que não foram observadas interações significativas entre uma dieta com cálcio, diabetes e risco de DCV. O impacto negativo relacionado aos suplementos de cálcio em pacientes com diabetes persistiu em uma análise repetida apenas com diabetes mellitus tipo 2, e mesmo em um modelo abrangente que ajustou para função renal, presença de osteoporose, e duração do diabetes, hábitos alimentares, além dos fatores de risco tradicionais de DCV. O maior risco relativo foi observado naqueles que apresentavam níveis séricos de cálcio mais elevados.

Explorando os subtipos de doença cardiovascular, a suplementação habitual de cálcio foi significativamente associada ao aumento do risco de insuficiência cardíaca, doença cardíaca isquêmica e doença cerebrovascular em pacientes com diabetes.

Por que a suplementação de cálcio prejudicaria os pacientes com diabetes?

Pacientes com diabetes apresentam resistência à insulina, função renal sob risco, e outros desafios com a homeostase do cálcio. Os mecanismos neste ponto são especulativos, mas provavelmente estão relacionados às interações endócrinas entre a ingestão de cálcio, o hormônio da paratireóide (PTH) e a regulação do fosfato.

Tanto a sinalização excessiva ou insuficiente do PTH pode afetar a saúde cardiovascular. Existe uma relação em forma de U entre os níveis de PTH e a mortalidade por DCV em pacientes com doença renal crônica, semelhante à relação em forma de U que os autores deste estudo observaram entre a ingestão de cálcio e a mortalidade por doenças cardiovasculares. A ingestão de grandes quantidades de cálcio de uma só vez, em doses baixas (500 mg) ou altas (1000 mg) pode levar à absorção abrupta de cálcio, resultando em hipercoagulação e calcificação vascular.

Na prática, na ausência de outras condições clínicas restritivas (por exemplo, má absorção gastrointestinal, lactação, etc.), parece prudente enfatizar a nutrição adequada de cálcio a partir da dieta, consistente com as diretrizes - particularmente nos pacientes com diabéticos.

Referência

Qiu Z, Lu Q, Wan Z, Geng T, Li R, Zhu K, Li L, Chen X, Pan A, Manson JE, Liu G. Associations of Habitual Calcium Supplementation With Risk of Cardiovascular Disease and Mortality in Individuals With and Without Diabetes. Diabetes Care. 2024 Feb 1;47(2):199-207.