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Qual o melhor critério para determinar congestão na insuficiência cardíaca?
Escrito por
Jefferson Vieira
Publicado em
8/7/2019
Congestão residual na alta hospitalar é um importante preditor de desfecho adverso e readmissão na IC, especialmente em pacientes com piora da função renal. Infelizmente, metade dos pacientes internados por IC recebe alta com algum grau de congestão residual. Uma causa comum da descongestão incompleta é a interrupção precoce dos diuréticos por piora da função renal, geralmente definida como um aumento no nível sérico de creatinina ≥ 0,3 mg/dL.
Mas fique atento à dica:
- A piora da função renal que acompanha a diureticoterapia agressiva reflete, na maioria dos casos, alterações hemodinâmicas ou funcionais da filtração glomerular, e não lesões tubulares.
Vários estudos já demonstraram que as alterações da função renal durante a terapia descongestiva são geralmente transitórias e estão associadas com um melhor (em vez de pior) prognóstico, pois presumivelmente indicam descongestão mais completa.
Por isso, a próxima dica é CRUCIAL:
- uma elevação de creatinina de 1,5 para 1,9 mg/dL não deve restringir terapia diurética adicional na IC descompensada se ainda houver evidência clínica de congestão.
Determinar euvolemia, ou pelo menos o momento ideal de parar o diurético, continua sendo um grande desafio no manejo da IC. 40% dos pacientes congestos não apresentam estertores, edema e/ou turgência jugular e 20% exibem uma radiografia de tórax normal. Além disso, alterações no hematócrito e “hemodiluição” são marcadores questionáveis, podendo estar relacionadas com flebotomia e hiperesplenismo.
Mas então qual seria o exame ideal para definir se ainda há congestão?
- O exame padrão-ouro para determinar congestão ainda é o cateterismo da artéria pulmonar (CAP) com medidas diretas das pressões de átrio direito (PAD > 7mmHg) e capilar pulmonar (PCP > 18 mmHg).
Entretanto, a natureza invasiva da terapia descongestiva guiada por CAP e a ausência de benefícios evidentes no ESCAPE trial limitam seu uso rotineiro na prática clínica. Uma revisão recente da Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC) comparou a precisão diagnóstica de achados semiológicos e ecocardiográficos contra a avaliação invasiva do CAP, e demonstrou acurácias variáveis (tabela abaixo). O achado semiológico isolado que mais ajuda na determinação da volemia é a medida do pulso venoso jugular, em centímetros, embora exista grande variabilidade inter-observador e um declínio na habilidade de realizar o exame na prática atual. A ESC também propôs uma avaliação multiparamétrica para determinar congestão residual na alta hospitalar, associando achados semiológicos com biomarcadores e técnicas não-invasivas (figura).
*Mais de 3 linhas B em mais de 2 espaços intercostais bilateralmente. PAD = pressão atrial direita; PCP = pressão capilar pulmonar; PVJ = pulso venoso jugular; S/D = velocidade sistólica/diastólica; TRC = terapia de ressincronização cardíaca; USG = ultrassonografia; VCI = veia cava inferior; VPP = ventilação com pressão positiva. Adaptado de Mullens W, et al. Eur J Heart Fail (2019).
BNP = peptídeo natriurético tipo B; NP = peptídeo natriurético; NT-proBNP = porção N-terminal do peptídeo natriurético tipo B; PVJ = pulso venoso jugular; RHJ = refluxo hepato-jugular; TC6m = teste da caminhada de 6 minutos. Adaptado de Mullens W, et al. Eur J Heart Fail (2019) e Gheorghiade M, et al. Eur J Heart Fail (2010).