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Protocolo SPIKES: como comunicar más notícias para seu paciente?
Escrito por
Eduardo Lapa
Publicado em
29/9/2021
Nas aulas de medicina geralmente não se tem o treinamento ou direcionamento de como se comunicar com o paciente e seus familiares em situações de diagnósticos com mau prognóstico. Contudo, esses diagnósticos fazem parte do dia a dia do médico na maioria das especialidades. Como então fazer a comunicação de más notícias? Ao longo desse post, vamos ver como o protocolo SPIKES pode nos ajudar nessa missão.
A comunicação é uma habilidade global, necessária em qualquer meio. Algumas pessoas acham que a comunicação é um dom. Na verdade, essa é uma habilidade treinável e que pode ser melhorada através de técnicas específicas.
Comunicar x Informar
Antes de partir para formas de comunicar, é importante entender a diferença entre Comunicar e Informar.
- Ao se comunicar com alguém, a conversa é de mão dupla, passar e receber.
- Já informar é apenas emitir uma mensagem, sem a troca de receber e emitir.
Então, como é feita a comunicação adequada?
A comunicação adequada é feita quando você transmite uma mensagem e o receptor consegue compreender o conteúdo. Existem alguns passos que são usados como base para auxiliar neste processo.
Antes de começar a pensar sobre como comunicar, é importante entender que uma notícia ruim pode ter significados diferentes para diferentes pessoas. Isso depende de um fator importante, o chamado “background” da pessoa, ou o histórico de vida.
Uma notícia comunicada de forma inadequada pode causar grandes traumas e até mesmo fazer com que as pessoas se sintam desencorajadas a prosseguir com o tratamento. É preciso ter empatia e saber lidar com os sinais verbais e não verbais que o receptor passa e saber como prosseguir.
Quais os efeitos que essa comunicação pode causar?
Quando as informações são passadas aos pacientes ou familiares e existe o entendimento adequado de toda situação, ele poderá sanar todas as dúvidas referentes ao diagnóstico e ao tratamento. Em casos em que isso não ocorre tão bem, alguns pacientes e seus familiares podem ficar com dúvidas, medos e inseguranças, até mesmo não dar credibilidade ao profissional, fazendo com que a adesão à tratamentos seja negada. Ao passar informações claras e empáticas, o processo fica humanizado. Ter empatia é entender o que é importante para o outro, entender o que ele compreende e se ele deseja saber mais, ir adiante.
Protocolos e Estratégias
Profissionais de saúde podem sempre se especializar e procurar treinamentos para facilitar esse processo. Vale lembrar que essa habilidade é mais do que uma técnica engessada, é uma forma de auxiliar, mas pode ser adequada a forma que o profissional achar que encaixa melhor. As estratégias e protocolos são baseadas na ideia de Comunicação Não Violenta de Marshall Rosenberg, que apoia relações de parceria e cooperação na comunicação eficaz e empatia.
O protocolo SPIKES ajuda a definir os passos a serem seguidos ao se comunicar uma má notícia:
S (Setting up the interview) - o primeiro passo do protocolo SPIKES é se preparar. A comunicação deve ser feita preferencialmente em um ambiente calmo e livre de ruídos. Peça para que o paciente ou familiares se sentem. É preciso decidir quem vai estar presente. Em alguns casos é interessante que estejam presentes todos da equipe que poderão auxiliar no processo e não apenas o médico. Nesses casos, ficar atento para que haja mais membros da família do que da equipe de saúde. Isso faz com que o ambiente fique mais acolhedor para o paciente que verá uma quantidade maior de rostos familiares do que de profissionais que muitas vezes podem ser desconhecidos para quem está recebendo a notícia.
P (Perception) - é onde o médico tenta compreender o quanto o paciente sabe e entende da situação. Pode-se perguntar: "O que o senhor sabe sobre a situação?". Ou: "O que a senhora imagina que o exame mostrou?"
I (invitation) - aqui se deve saber se o paciente prefere receber todas as informações ou se ele prefere que as informações sejam repassadas para um determinado familiar. Alguns pacientes idosos podem dizer: "tudo sobre a minha situação o senhor pode falar para minha filha que ela resolve. O que ela achar importante ela me passa depois".
É sempre importante lembrar que todo paciente tem o direito de saber o que tem, mas também é direito dele não querer saber. Em alguns casos, familiares pedem para que o paciente não seja informado. Porém, cabe ao médico informar que se o paciente é lúcido e deseja saber, ele tem esse direito. Ou seja, caso o paciente deixe claro que não quer saber da notícia, o médico pode omitir aquela informação para ele e repassar apenas para o familiar. Já se o paciente pergunta de forma direta e clara se possui um determinado diagnóstico (ex: câncer), o médico não pode mentir sobre o diagnóstico.
(Warning Shot) - esse passo não está necessariamente no protocolo, porém é uma chave utilizada para iniciar a comunicação da notícia. A tradução livre é “tiro de aviso". Consiste em dar avisos do que está por vir. Exemplo: "Infelizmente não tenho boas notícias para dizer".
Além disso, é necessário lembrar que não se pode apenas falar sem parar. Às vezes o paciente precisa de tempo para assimilar e ainda, para fazer perguntas ou confirmar as informações.
K (Knowledge) - as informações são passadas ao paciente, de forma clara e sem a utilização de palavras complicadas ou muito técnicas. O profissional precisa perceber até onde ele está sendo entendido. A forma com que essa passagem de informação é feita afeta a adesão ao tratamento e outros fatores.
Para saber lidar com essa fase e com a seguinte do protocolo SPIKE, utiliza-se também da estratégia NURSE.
Após passar a situação ao paciente ou familiar, ele entrará para a etapa E (Emotions). Essa é considerada a parte mais difícil. O médico precisa entender se deve prosseguir ou não com a comunicação.
É neste momento que se utiliza a NURSE (Naming, Understanding, Respecting, Supporting, Exploring). O objetivo é abordar as emoções que o paciente terá.
1- Nomear o que o paciente está sentindo.
2- Compreender a situação e a emoção, validar aquilo que já foi dito, então perguntar: “o que você entende sobre tudo isso?”
3- Demonstrar respeito ao que a pessoa está sentindo, não necessariamente verbalizar, mas demonstrar esse respeito.
4- Demonstrar apoio e conversar sobre estratégias de enfrentamento, quais podem ser os próximos passos.
5- Focar no que o receptor quer saber, se ele quer saber mais. Explorar o que fazer a seguir.
S (Strategy and summary) - esse é o último passo do protocolo SPIKES. Pergunte ao seu paciente se ele está pronto para prosseguir a discussão. Perguntar o que ele entende até ali. Se ele estiver pronto, discutir estratégias e quais serão os próximos passos.
*É importante o profissional se colocar à disposição para passar a notícia para a família, às vezes, marcar um outro encontro para que esse paciente não precise passar essa informação sozinho para os familiares*
O protocolo SPIKES tem como objetivo auxiliar, mas vale lembrar que não é uma regra engessada, pode e deve ser adaptada às situações.
Conclusão
O protocolo SPIKES nos ajuda a sistematizar a comunicação de más notícias para nosso paciente.
Para saber mais sobre o assunto, veja nosso podcast: