Compartilhe
Por Que Os Pacientes Que Usam Isotretinoína Podem Ter Olho Seco?
Escrito por
Cláudia Elise Ferraz Silva
Publicado em
15/2/2023
POR CLÁUDIA ELISE
A isotretinoína oral é um dos medicamentos mais prescritos entre dermatologistas. Apesar de apresentar um perfil de segurança adequado, eventos adversos a esta medicação são comuns. Antes de prescrevê-la, nós médicos perguntamos sobre gestação, realizamos testes sorológicos e bioquímicos (incluindo colesterol triglicerídeos e enzimas hepáticas). Contudo as manifestações oculares, por vezes, têm sido negligenciadas. Apesar de serem geralmente leves, pode causar importante morbidade ocular.
Doença do olho seco evaporativo é o efeito ocular adverso mais comumente associado ao uso da isotretinoína e é definida como uma condição onde há perda da homeostase do filme lacrimal associada a diversos sintomas como desconforto ocular, secura, sensação de corpo estanho, dor, visão turva e fotofobia.
O filme lacrimal é composto por 3 camadas: 1) uma camada interna de mucina; 2) uma camada aquosa e mais volumosa do filme; 3) uma camada lipídica externa – justamente produzida pelas glândulas de Meibomius. A integridade da superfície ocular depende de uma composição adequada do filme lacrimal. Em indivíduos saudáveis é esta camada lipídica que permite que o filme lacrimal permaneça aderido à superfície ocular ao piscar os olhos, evitando sua rápida evaporação.
Fonte: Arq Bras Oftalmol. 2010 Mar-Apr;73(2):197-203.
Evidências mostram que a isotretinoína induz apoptose e inibe o crescimento de diversas células, incluindo os sebócitos humanos, não só no folículo piloso, mas também nas glândulas de Meibomius, causando disfunção local (com redução da secreção lipídica) e consequente alteração do filme lacrimal. Este é o fator preponderante no olho seco dos pacientes que usam a medicação. Há também uma diminuição da densidade e volume das células caliciformes produtoras de mucina do epitélio conjuntival. Aliado a isso, já foi demonstrada redução da sensibilidade da córnea após 3 meses de tratamento com o retinóide.
Então pacientes que usam isotretinoína podem desenvolver alteração na formação de mucina e rompimento da camada lipídica resultando em instabilidade do filme lacrimal, com evaporação rápida, aumento da osmolaridade e sintomas oculares. Isto ainda é acentuado pela diminuição da sensibilidade da córnea e subsequente redução de mecanismos protetores da superfície ocular como o ato de piscar e lacrimejar.
Naturalmente, casos graves de olho seco de pacientes que usam isotretinoína requerem manejo especializado. Entretanto casos leves – que são a maioria - podem ser adequadamente reconhecidos e tratados pelo dermatologista. Então não deixe de incluir orientação quanto aos cuidados oculares nas consultas desses pacientes!
Fontes:- Ruiz-Lozano RE, Hernández-Camarena JC, Garza-Garza LA, Bustamante-Arias A, Colorado-Zavala MF, Cardenas-de la Garza JA. Isotretinoin and the eye: A review for the dermatologist. Dermatol Ther. 2020 Nov;33(6):e14029. doi: 10.1111/dth.14029. Epub 2020 Aug 12. PMID: 32683764. - Fonseca EC, Arruda GV, Rocha EM. Olho seco: etiopatogenia e tratamento [Dry eye: etiopathogenesis and treatment]. Arq Bras Oftalmol. 2010 Mar-Apr;73(2):197-203. Portuguese. doi: 10.1590/s0004-27492010000200021. PMID: 20549055.