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O que sabemos (e o que não sabemos) sobre TAVI em pacientes de baixo risco cirúrgico?
Escrito por
Humberto Graner
Publicado em
28/10/2020
Dois ensaios clínicos recentes compararam implante de valva aórtica transcateter (TAVI) versus cirurgia de troca valvar aórtica (CTVA) em pacientes de baixo risco para a cirurgia (Você pode rever em detalhes aqui). Resumidamente:
PARTNER 3 – avaliou 1.000 pacientes (idade média 73 anos) e demonstrou que a TAVI com prótese SAPIEN 3 (expansível por balão) foi superior à CTVA em 1 ano (morte, AVC, re-hospitalização: 8,5% versus 15,1%, P=0,001), e não-inferior aos 2 anos (11,5% versus 17,4%, P=0,007.
EVOLUT Low Risk – incluiu 1.468 pacientes (idade média 74 anos) e evidenciou que a TAVI com prótese auto-expansível Evolut foi não-inferior à CTVA ao final de 2 anos (morte ou AVC com sequelas: 5,3% versus 6,7%).
Esses estudos causaram uma comoção na comunidade científica cardiovascular, com a perspectiva de que TAVI seja o tratamento padrão para estenose aórtica grave, independente do paciente.
Mas será que é isso mesmo?
Um editorial recente levantou alguns pontos importantes antes de indicarmos TAVI para pacientes jovens e de baixo risco cirúrgico:
Esses resultados não valem para todos os pacientes!
Pacientes com valva aórtica bicúspide, doenças da aorta, calcificação importante na via de saída, doença coronária complexa (SYNTAX > 22), e insuficiência mitral moderada a grave ou regurgitação tricúspide grave foram excluídos desses estudos.
A durabilidade das próteses aórticas transcateter é incerta.
Nós não sabemos em definitivo quanto tempo duram as próteses transcateter. Em octogenários, há evidências de durabilidade similar entre TAVI e CTVA em 5 anos. No entanto, a prótese cirúrgica degenera mais cedo e mais rápido em indivíduos mais jovens. Mesmo com a perspectiva de procedimentos adicionais “valve-in-valve”, nós não sabemos quantas vezes isso poderia ser repetido. E realizar cirurgia de troca valvar em um paciente com TAVI prévia tem alta mortalidade.
TAVI tem mais risco de trombose do que próteses cirúrgicas.
A trombose de folhetos valvares é fenômeno conhecido de próteses biológicas, mas é muito mais comum em próteses transcateter. O impacto disso a longo prazo é desconhecido, e especula-se que essas tromboses podem contribuir para deterioração da TAVI.
Distúrbios da condução são mais comuns com TAVI.
TAVI é associada a uma incidência 3 vezes maior de BRE ou necessidade de marca-passo definitivo. Ambas as situações se associam a menor fração de ejeção e maior taxa de hospitalizações por IC a médio e longo prazo.
Leak paravalvar relacionada a TAVI ainda assombra o cardiologista.
PARTNER-3 e Evolut Low Risk ainda reportaram maiores taxas de leak paravalvar com TAVI do que com a cirurgia. A presença de leak moderada a importante está associada a aumento da mortalidade e hospitalização por IC nesses pacientes.
ICP em pacientes com prótese aórtica transcateter pode ser problemática.
Pacientes com DAC complexa (SYNTAX >22) foram excluídos dos estudos, e há pouca evidência e experiência com intervenções coronárias em pacientes com TAVI. E as dificuldades de se acessar as coronárias nesses pacientes pode ser particularmente importante no contexto de síndromes coronárias agudas.
Concluindo, todos estes tópicos ainda precisam ser melhor abordados (e contornados), antes que TAVI possa ser considerada a modalidade preferencial de troca valvar aórtica em pacientes mais jovens com estenose aórtica leve.
Referência
Hanzel GS, Gersh BJ. Transcatheter Aortic Valve Replacement in Low-Risk, Young Patients Natural Expansion or Cause for Concern? Circulation. 2020;142:1317–1319