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Mitraclip: a batalha COAPT x MITRA-FR continua...
Escrito por
Tiago Bignoto
Publicado em
30/12/2021
Recentemente estamos acompanhando um aumento substancial na indicação do uso do MitraClip no tratamento da insuficiência mitral, seja ela primária, embasado pelo EVEREST II, seja ela secundária, embasado pelos recém-publicados COAPT e MITRA-FR. Independentemente das questões inerentes da anatomia valvar de cada uma das etiologias tratadas, um aspecto acabou sendo unanimidade entre essas publicações: a segurança do procedimento, com baixas taxas de complicações relacionadas à intervenção ou ao dispositivo.
Baseado nisso, uma certa expansão de indicações veio, na tentativa de trazer algum benefício aos pacientes. Após uma profunda análise nas características de inclusão dos trabalhos relacionados ao uso do MitraClip nos pacientes com insuficiência mitral funcional, um perfil provavelmente mais respondedor foi delimitado, baseado nos achados do COAPT, mas, em um mundo real, essa abordagem nem sempre é possível.
Para tentar observar esses achados e colocar à prova os critérios de elegibilidade, uma análise retrospectiva de banco de dados europeu avaliou os critérios estabelecidos no COAPT e no MITRA-FR em mais de mil pacientes com insuficiência mitral funcional e que foram tratados com MitraClip. Com uma média de idade de 74 anos e de alto risco cirúrgico (STS médio de 7%), mais de 350 pacientes eram considerados com parâmetros que incluiriam no COAPT trial e 408 para o MITRA-FR. No entanto, vale ressaltar que alguns pacientes eram elegíveis para ambos os modelos, logo, observar os inelegíveis também pode nos dar algumas informações interessantes.
Eram considerados inelegíveis para o COAPT, 669 pacientes, enquanto, inelegíveis para o MITRA-FR, 437 pacientes. Isso já corrobora a rigorosidade elevada do COAPT em relação à inclusão dos pacientes. Após essa seleção, alguns dados ficaram evidentes. Aparentemente, os critérios de seleção utilizados no COAPT apontam realmente para pacientes com sobrevida maior quando submetidos ao implante de MitraClip. Independentemente do ganho de sobrevida, mesmo estando fora dos critérios de elegibilidade do COAPT, os pacientes apresentavam melhora de sintomas, avaliado por classe funcional, caminhada de 6 minutos e qualidade de vida.
Um achado interessante nessa análise retrospectiva que representaria o mundo real é que os pacientes acabam se encontrando num espectro entre os dois extremos, COAPT e MITRA-FR. Eles acabam tendo aspectos anatômicos e funcionais que não seriam tão adequados quanto os selecionados no COAPT e nem tão avançados e, portanto, inadequados ao tratamento percutâneo, quanto no MITRA-FR.
Um dos conceitos mais difundidos para explicar esses achados distintos é o de regurgitação mitral desproporcional, ou a relação entre o valor do ERO, um parâmetro ecocardiográfico de gravidade de insuficiência mitral e o volume diastólico final do ventrículo esquerdo, o que acaba por traduzir a mesma relação: muita regurgitação para um ventrículo não tão dilatado seria o ponto ideal para o tratamento percutâneo. No entanto, esses achados ainda não estão totalmente validados do ponto de vista clínico em pacientes fora dos trials. Para isso, ainda precisamos de mais informações, embora haja elevada plausibilidade fisiopatológica nos mecanismos propostos.
Outro dado relevante é a repercussão no lado direito do coração que aponta para pacientes em pior estado e com respostas menores ao tratamento percutâneo. Tanto nos critérios de inclusão do COAPT, quanto do MITRA-FR, função ventricular direita, pressão de artéria pulmonar e níveis séricos de BNP apontam para maus respondedores à terapêutica intervencionista. O que fica é que esses critérios devem, obrigatoriamente passar pela discussão de intervenção nesses pacientes, claro, em ambiente cooperativo de Heart Team.
Quer saber mais sobre mitraclip? Acesse nosso podcast sobre o assunto: