Insuficiência mitral secundária: como tratar?

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A insuficiência mitral secundária (ou funcional) está presente em diversas situações no dia a dia da cardiologia clínica e é responsável pela deterioração clínica em até um terço dos pacientes com insuficiência cardíaca e redução da fração de ejeção. Como é sabido, diversas são as causas que podem originar uma regurgitação mitral funcional, sendo a principal delas a miocardiopatia dilatada e a cardiopatia isquêmica.

Como o acometimento principal se dá no ventrículo esquerdo e não no aparato mitral em si, as abordagens atuais ainda são desafiadoras, heterogêneas e estão se aprimorando.

A abordagem cirúrgica, seja através de plástica valvar ou implante de prótese, ainda é controversa e tem benefício muitas vezes questionável. Não apenas nos aspectos sobre mortalidade, mas também sobre eficácia de uma determinada técnica de reparo sobre outra.

Recentemente, a publicação do COAPT trouxe mais alguns dados interessantes, mostrando que, um determinado grupo de pacientes com insuficiência mitral funcional poderia se beneficiar de intervenção transcateter na valva mitral, com o MitraClip.

A insuficiência mitral secundária, além de ser um marcador prognóstico ao representar o grau de disfunção e remodelamento do ventrículo esquerdo, também é um ativo no processo de deterioração hemodinâmica, pois faz parte de um ciclo vicioso em que mais regurgitação leva a maior dilatação e por consequência, maior regurgitação.

Diante desse espectro na adaptação hemodinâmica ventricular, surgiram os conceitos de insuficiência mitral proporcional e desproporcional, em que a fração de sangue que regurgita é comparada com o volume diastólico do ventrículo que irá comportar essa elevada pré-carga. Pacientes com insuficiência mitral desproporcional, ou seja, com regurgitações muito grandes para ventrículos ainda relativamente pequenos parecem se beneficiar de terapia intervencionista.

A abordagem desses pacientes deve ser, se possível, multimodalidade, visto uma série de repercussões apresentadas. Inicialmente se sugere realizações dos seguintes métodos diagnósticos:

  • Eletrocardiograma
  • Laboratório (hemoglobina, função renal e peptídeo natriuréticos)
  • Ecocardiografia (com análise de fibrose e viabilidade)
  • Angiografia coronariana (invasiva ou não).

Dados da ecocardiografia são fundamentais para uma adequada avaliação, tanto do ponto de vista anatômico que poderiam ajudar a guiar uma possível intervenção, ou hemodinâmico, para ajustar a necessidade de otimização clínica.

A avaliação deve levar em consideração alguns parâmetros como:

  • Grau de Tethering mitral e área formada
  • Profundidade da coaptação
  • Localização do Jato (Central vs. Comissural)
  • Comprimento e ângulo entre folheto posterior e anel mitral
  • Calcificação

Dados sobre sincronia ventricular também são importantes, visto as indicações de terapia de ressincronização.

O clínico e, principalmente o ecocardiografista, deve ter em mente que a insuficiência mitral funcional é um processo dinâmico e está sujeito a diversas repercussões do status hemodinâmico do paciente, como volemia, frequência cardíaca e pressão arterial. Portanto, o cuidado com a adequada classificação de gravidade deve atentar-se para esse fato e também para as limitações dos métodos empregados.

Pacientes que se encontram nessa condição, tiram mais proveito de uma abordagem por Heart Team que inclua um especialista em disfunção miocárdica, para compor uma decisão colegiada, visto ser um paciente extremamente complexo e dinâmico.

De toda forma, independentemente da valvopatia, esse paciente deve receber um conjunto de medicamentos para uma terapia clínica otimizada. Aqui se encontram classes medicamentosas já consagradas na literatura como os inibidores da ECA e os beta-bloqueadores, mas recentemente algumas outras classes demonstraram efeitos benéficos importantes nas determinadas indicações como a ivabradina, a associação de sacubitril e valsartana e o uso de hidralazina e nitratos em casos de contraindicações dos demais.

Temos como perspectivas uma série de dispositivos novos surgindo que atuam em outros pontos do aparato mitral diferentes do consagrado reparo Edge-to-Edge do MitraClip. Assim, mecanismos de anuloplastia e dispositivos de reparo dos folhetos estão sendo desenvolvidos e podem, com os mecanismos que temos descoberto, complementarem determinada abordagem ou até mesmo nos revelar novos aspectos hemodinâmicos.

Podemos nos guiar pelos seguintes itens:

  • A IM funcional se associa a um pior prognóstico;
  • A gravidade deve ser analisada por ecocardiografista experiente, usando métodos multiparamétricos em paciente compensado hemodinamicamente;
  • A abordagem deve ser realizada por Heart Team experiente;
  • O tratamento clínico deve ser otimizado o máximo possível, incluindo terapias não rotineiras como ressincronização, dispositivos de suporte circulatório, etc;
  • Abordagem cirúrgica deve ser considerada em concomitância com cirurgia de revascularização miocárdica;
  • O MitraClip pode ser indicado em pacientes otimizados e que preencham o critério de IM desproporcional;
  • Intervenção só deve ser realizada se expectativa de vida superior a 1 ano.

Resumo da diretriz de valvopatia da SBC de 2020 de quando usar mitraclip para tratar insuficiência mitral secundária: