Compartilhe
Insuficiência cardíaca e nefropatia: como manejar?
Escrito por
Mônica Ávila
Publicado em
29/5/2019
Pacientes com insuficiência cardíaca (IC) e insuficiência renal crônica avançada (IRC), com taxa de filtração glomerular < 30 ml/min por 1,73 m2 e ainda sem a terapia de substituição renal, constituem um número importante de pacientes que apresentam pior prognóstico devido a essas morbidades. Em pacientes in IC e fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) reduzida (ICFEr) a prevalência da IRC avançada é aproximadamente 10%. Apesar da alta prevalência, esses pacientes não são incluídos com frequência em estudos clínicos de terapia medicamentosa. Uma revisão recente discute as limitações dos estudos publicados nessa população e oferece um guia de tratamento para esses pacientes.
Limitações do tratamento da IC nessa população:
- Pouca representação em ensaios clínicos - os ensaios clínicos que são destinados a pacientes com ICFEr e IRC são pouco comuns e a evidência acaba sendo exploratória de populações sem IRC ou com IRC leve.
- Limitação no entendimento da proteinúria – apesar do crescente reconhecimento da importância da proteinúria na avaliação a disfunção renal em pacientes com ICFEr, os estudos que avaliaram o tratamento medicamentoso da ICFEr que contemplaram proteinúria não reportaram dados referente a proteinúria durante o tratamento.
- Falta de padronização das definições – o declínio da função renal em pacientes com ICFEr pode ser decorrente de varios fatores, como descompensação do quadro e até da introdução dos inibidores do sistema renina angiotensina. As definições do grau, do tempo e da rapidez de declínio da função renal variam, dificultando uma padronização.
- Confusão nos resultados – muitos resultados nos estudos observacionais podem ser limitados por confundidores como: pacientes muito doentes, frágeis e sob risco de pior prognóstico, podem não receber o tratamento medicamentoso otimizado devido a preocupação de eventos adversos. Isso pode atribuir um benefício do tratamento medicamentoso, quando na verdade não é levado em conta o status basal do paciente.
- Preocupação com eventos adversos - muitas medicações podem causar eventos adversos em pacientes com IRC avançada que afetam o risco-benefício do uso de certos medicamentos para essa população.
Considerando a expectativa de vida limitada e comorbidades, muitas vezes experimentadas por esses pacientes associada a evidência limitada de ensaios clínicos, muitos médicos podem ser dissuadidos de iniciar a terapia medicamentosa otimizada nessa população e com isso, esses pacientes acabam não recendo a terapia recomendada pelas diretrizes.
Terapia Medicamentosa
Em relação ao tratamento medicamentoso otimizado da ICFEr em pacientes com IRC avançada (Taxa de filtração glomerular <30 ml/min por 1,73 m2), a figura abaixo resume as doses recomendadas e a monitorização necessária nesses pacientes:
Legenda: IECA- Inibidores da enzima de conversão da angiotensina, BRA- Bloqueador do receptor de angiotensina, INRA- inibidor do receptor da angiotensina e neprilisina, ARM - antagonistas dos receptores mineralocorticoides
Outros tratamentos a serem considerados
- Os novos potássio binders, como patiromer e o ciclosilicatocircônio de sódio, podem melhorar a hipercalemia associada ao uso dos inibidores do sistema renina-angiotensina, particularmente em populações com IRC. Eles agem para remover potássio pela troca de cátions por potássio no cólon distal, quelando o potássio e aumentando sua excreção fecal. Contudo, essas terapias também exigem avaliação dos de eventos adversos potenciais, como ligação de medicamentos orais concomitantes, desconforto gastrointestinal, hipomagnesemia e piora do edema.
- Dispositivos implantáveis – O uso de dispositivos em pacientes com ICFEr e IRC avançada é controverso, mesmo com o benefício demonstrado em pacientes com IC. Uma análise secundária do Multicenter Automatic Defibrillator Implantation Trial-II não demonstrou diminuição da mortalidade da terapia com cardiodesfibriladores implantáveis (CDI) em pacientes com taxa de filtração glomerular <35 ml/min por 1,73 m2. Embora 1 estudo tenha mostrado melhora da taxa de filtração glomerular com terapia de ressincronização cardíaca naqueles pacientes com IRC com taxa de filtração glomerular entre 15 - 29 ml /min por 1,73 m2, nenhum estudo especificamente avaliou o benefício da terapia de ressincronização cardíaca na IRC avançada. Nesta população, fatores como a expectativa de vida e os riscos periprocedimentos devem ser equilibrado ao considerar o potencial benefício dos implantes de dispositivos.
Em conclusão, a falta de evidências de alta qualidade para a terapia medicamentosa otimizada em pacientes com ICFEr e doença renal crônica avançada deixa poucas opções para o manejo desta vulnerável população. A terapia medicamentosa otimizada é extrapolada das recomendações em pacientes com ICFEr sem doença renal, com algumas particularidades já descritas acima. Claramente, ensaios clínicos adequados com a avaliação da monitorização e seguimento são necessários para avaliar os benefícios dessas terapias.
Referência