Compartilhe
Trabalhos clássicos de dislipidemias: AFCAPS/texCAPS
Escrito por
Eduardo Lapa
Publicado em
25/11/2013
Recentemente publicamos as novidades trazidas pelo novo guideline americano de dislipidemias. Como sempre, surgiram várias dúvidas em relação ao uso de estatinas no contexto de prevencão primária (pctes sem doença cardiovascular estabelecida). Julgamos que a melhor forma de dirimir estas dúvidas é indo além do guideline e analisando os trabalhos originais que basearam as recomendações da diretriz. A mesma cita vários trabalhos sobre uso de estatinas na prevenção primária de eventos cardiovasculares sendo os principais:
– AFCAPS/texCAPS
– ASPEN
– AURORA
– JUPITER
– CARDS
– MEGA
Revisaremos estes trabalhos para tirarmos as nossas próprias conclusões. Iniciaremos pelo AFCAPS/texCAPS.
– Trabalho publicado no JAMA em 1998 – Downs J, Clearfield M, Weis S et al. Primary prevention of acute coronary events with lovastatin in men and women with average cholesterol levels. Results of AFCAPS/TexCAPS. Air Force/Texas Coronary Atherosclerosis Prevention Study. JAMA 1998;279:1615–1622.
– A sigla do estudo vem do termo: The Air Force/Texas Coronary Atherosclerosis Prevention Study.
– Estudo randomizado, controlado, duplo cego, desenvolvido em 2 centros do Texas.
– 6.605 pctes (85% homens)
– critérios de inclusão – homens entre 45 e 73 anos e mulheres entre 55 e 73 anos, sem doenças cardiovasculares prévias e que preenchessem os seguintes critérios de lipidograma: CT entre 180 e 264, LDL entre 130 e 190, HDL <45 em homens e <47 em mulheres, TG < 400.
– estudo testou placebo x lovastatina 20 mg/d. O grupo que recebia a estatina tinha a dose da medicação elevada para 40 mg/d caso o LDL após 3 meses de tratamento estivesse acima de 110. Isto terminou ocorrendo em metade dos pctes do grupo da estatina.
– End point primário – ocorrência de evento coronariano maior definido como IAM (fatal ou não fatal), angina instável ou morte súbita de origem cardíaca.
– Follow up médio – 5,2 anos
– O estudo foi truncado, ou seja, terminado antes do programado devido a demonstração de benefício no grupo da estatina.
– o grupo da estatina teve uma queda média de 25% nos níveis de LDL. O LDL médio do grupo estatina foi de 115.
– Houve redução de 37% do desfecho primário com o uso de estatina. O risco de eventos coronarianos maiores caiu de 10,9% para 6,8% com o uso da medicação.
– Em relação aos desfechos secundários, houve diminuição significativa de revascularizações miocárdicas, angina instável e IAM na ordem de 30-40%. Não houve diminuição de mortalidade cardiovascular. Não era esperado ver diferença de mortalidade já que o estudo não foi desenhado para isto, faltando portanto poder estatístico para tal fim.
– Em relação ao surgimento de efeitos colaterais, a incidência de elevação de transaminases, elevação de cpk, mialgia e rabdomiólise foi similar no grupo estatina x grupo placebo.
COMENTARIOS:
– O estudo foi truncado. Para ver uma ótima revisão da limitacão de estudos truncados, acessar este artigo escrito pelo Dr Luís Cláudio.
– Este estudo foi bastante comentado na época do seu lançamento por ser o primeiro trial a mostrar benefício de estatinas em em prevenção primária em pctes com perfil lipídico mais próximo da população ‘normal’ . Os trials prévios como o WOSCOPS randomizaram pctes com LDL médio acima de 190, ou seja, neiveis bastante alterados.
– Neste estudo, assim como nos outros que avaliaram o uso de estatinas em prevenção primária e secundária, não há objetivo de se alcançar meta de LDL menor que 100 ou 70, como citado em outros guidelines. Até havia a recomendação de se elevar a dose da lovastatina caso o LDL após 3 meses não tivesse caído para menos de 110 mas no final das contas o LDL médio do grupo estatina foi de 115.
– Ao avaliarmos a tabela 1 do estudo observamos que o pcte avaliado no estudo era em média homem, branco, 57 anos, CT 221, HDL 36, PAS 138. Se utilizarmos a calculadora de risco proposta pela AHA chegaremos a um risco de 10,9% de eventos em 10 anos – ou seja, haveria indicacão de tratar com estatina uma vez que o risco supera os 7,5% em 10 anos.