Como manejar o hipogonadismo pós uso de esteroide anabolizante?

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O uso de esteroides anabolizantes para fins estéticos vem aumentando em prevalência nos últimos anos, especialmente entre homens. Entre as várias consequências negativas desta prática, está o hipogonadismo causado pela inibição hipofisária da secreção de gonadotrofinas. E, cada vez mais, pacientes com esta complicação têm procurado especialistas com o objetivo de reverter este quadro. Portanto, é fundamental saber como manejar o hipogonadismo pós uso de esteroide anabolizante.

A inibição da função gonadal causada pelos esteroides anabolizantes levam tanto a uma redução da produção endógena de testosterona quanto à redução do volume testicular, com consequente prejuízo da espermatogênese e consequente infertilidade. Na maioria dos casos, a inibição do eixo gonadal é reversível, especialmente entre aqueles que fizeram uso do esteroide por um curto tempo e que possuíam função gonadal normal antes de iniciar o uso, como mostra coorte prospectiva recentemente publicada.

No entanto, naqueles que fizeram uso por período mais prolongado ou que já possuíam alguma alteração prévia da função gonadal, pode não ocorrer a resolução espontânea, sendo necessário alguma intervenção terapêutica. Vale salientar que, em alguns casos, o hipogonadismo pode se estabelecer de forma irreversível, independente do tratamento realizado.

Mas qual seria o tratamento padrão para os pacientes que não restauram espontaneamente a função gonadal? O clomifeno, um SERM (modulador seletivo do receptor de estrógeno), deve ser a terapia inicial de escolha. A droga, na dose de 50mg em dias alternados ou uma vez ao dia, é capaz de bloquear a ação inibitória do estradiol sobre a hipófise, interrompendo, assim, o feedback negativo e aumentando a secreção de LH e FSH.

Com o aumento da ação das gonadotrofinas sobre os testículos, a produção androgênica e a espermatogênese podem ser restauradas, caso não tenha ocorrido lesão tóxica direta do esteroide anabolizante sobre o tecido testicular.

Vale ressaltar que, naqueles pacientes que suspenderam o anabolizante há pouco tempo e que estão muito sintomáticos, é necessário associar reposição de testosterona ao clomifeno, com o objetivo de aliviar os sintomas e reduzir, assim, o risco de o paciente ter uma recaída e voltar a usar o esteroide.

Afinal, além dos sintomas de deficiência androgênica, o paciente pode também sofrer de sintomas psíquicos decorrentes da adicção desenvolvida. A testosterona em gel (25 a 50mg ao dia) tem sido apontada como a preparação de escolha para estes casos e deve ser mantida por até 2 meses.

Após 2 a 3 meses do início do clomifeno devem ser repetidas as dosagens de testosterona total, FSH e LH (e espermograma caso a restauração da fertilidade seja uma preocupação do paciente). Se normais, o clomifeno deve ser mantido por 4 a 6 meses e, então, descontinuado.

Caso a função gonadal ainda não tenha sido reestabelecida, orienta-se associar, ao clomifeno, o HCG, que, ao se ligar aos receptores testiculares de LH, estimulam diretamente a função gonadal. A dose orientada é de 1000 a 3000 UI 3x/semana. No entanto, como não há acesso a estas preparações no Brasil, podemos iniciar na dose de 5000UI 1x/semana.

Após 3 meses da associação do HCG, os exames devem ser repetidos e, se normais, suspendemos o HCG e mantemos o clomifeno por mais 3 meses. Se, no entanto, ainda não tiver ocorrido a recuperação da função gonadal, o paciente, provavelmente, apresenta hipogonadismo irreversível e a terapia de reposição de testosterona deve ser iniciada (caso a infertilidade não seja um problema).

No entanto, se o paciente ainda quiser tentar restaurar a fertilidade, pode-se manter o HCG e associar o FSH recombinante humano na dose 75 a 250UI 2 a 3x/semana. Se, mesmo assim, o paciente persistir infértil, ele deve ser encaminhado para avaliação de técnicas de reprodução assistida.

Percebe-se, portanto, que manejar o hipogonadismo pós uso de esteroide anabolizante não é sempre simples e, muitas vezes, não conseguimos ter sucesso na restauração da função testicular. Desta forma, é importante focar na prevenção, levando informação sobre os riscos (que vão além do hipogonadismo) à população geral.