Entendendo o Fenômeno de Lúcio

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Esse fenômeno foi descrito pela primeira vez por Lúcio e Alvarado em 1852, no México, e assim chamado por Lapatí e Zamora, em 1948. O fenômeno de Lúcio (FL) é uma manifestação rara, grave e difusa. A dificuldade de classificação existe há anos. Alguns autores o consideram uma variante da reação tipo 2 e outros o entendem como um terceiro padrão de resposta reacional, associado a distúrbio de coagulação. 

O Brasil persiste com elevadas taxas de incidência. Entre os anos de 2014 a 2018, a taxa média de detecção foi de 13,64 casos novos para cada 100 mil habitantes. A alta taxa de endemicidade reforça a importância de se estabelecer medidas de enfrentamento a fim de haver uma detecção precoce minimizando deformidades e incapacidades físicas.

O FL é um quadro reacional caracterizado por surtos de máculas eritematosas, dolorosas, ligeiramente infiltradas, e por bolhas hemorrágicas que evoluem com ulceração. Vários fatores podem precipitá-lo, como infecções, medicamentos e gestação. O FL tende a evoluir com formação de cicatrizes atróficas e estelares.

 O FL manifesta-se em geral de três a quatro anos após o início da doença em pacientes não tratados ou inadequadamente tratados. O padrão de evolução geralmente inicia-se nos membros inferiores, ascendendo para glúteos, membros superiores, mãos e, raramente, dorso e face. Os critérios para a definição do FL formam uma tríade: a ulceração cutânea, a trombose vascular e a invasão da parede dos vasos sanguíneos pelo bacilo de Hansen.

A fisiopatologia dos trombos oclusivos permanece não completamente elucidada. Ela pode se dar por dois mecanismos --- um deles, resultado de eventos imunomediados, e o outro, decorrente de efeito direto da própria presença do Mycobacterium leprae no vaso. Resultantes desses eventos, ocorrem isquemia, infarto e necrose tecidual, podendo chegar a coagulação intravascular disseminada.

As alterações detectadas nos exames laboratoriais descritas na FL são: anemia, velocidade de hemossedimentação elevada, hipoalbuminemia, hipergamaglobulinemia, reações sorológicas falso-positivas para sífilis, fator reumatoide positivo, crioglobulinas mistas, imunocomplexos circulantes e hipocomplementemia. No entanto, altos níveis de leucocitose são um achado característico  de FL, descrito em muitos outros estudos

Na histologia observam-se infiltrado inflamatório com histiócitos espumosos, dano vascular por invasão direta do M. leprae às células endoteliais, determinando vasculite e trombose dos vasos superficiais e profundos com conseqüente hemorragia e infarto da pele, e bacilos álcool-ácido resistentes na coloração de Ziehl ou de Fite-Faraco.

O tratamento consiste no emprego da poliquimioterapia para multibacilares e, algumas vezes, de corticóides sistêmicos para controle das reações. Ao contrário do eritema nodoso hansênico, o fenômeno de Lúcio quando ocorre na hanseníase de Lúcio não apresenta boa resposta à talidomida.