Devemos usar espironolactona na insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada?

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Devemos usar espironolactona na insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada?

Vimos no post anterior que a espironolactona mostrou-se eficaz quando usada em pacientes com FE abaixo de 35% e sintomáticos. Mas e em pacientes com IC e fração de ejeção preservada? Vale a pena usar esta medicação? Isso foi avaliado no estudo TOPCAT o qual resumimos no site anos atrás. Vamos colocar um resumo mais sucinto e atual aqui.

Em 2014, o estudo TOPCAT (n = 3.445) avaliou a espironolactona em doentes com IC de fração de ejeção preservada (ICFEP) e não demonstrou impacto sobre mortalidade, embora tenha reduzido as hospitalizações por IC. Assim como nos outros estudos com ARMs, no TOPCAT também houve um aumento significativo da creatinina sérica, mas sem necessidade de diálise. O TOPCAT tem uma curiosidade envolvendo diferenças geográficas entre os pacientes randomizados das “Américas” (Canadá, EUA, Argentina e Brasil) e aqueles da Europa Oriental (Rússia e da República de Geórgia). A análise post hoc revelou que os doentes randomizados da Europa Oriental (cerca de metade dos pacientes do estudo) tinham uma taxa de mortalidade semelhante à da população geral, ou seja, talvez não tivessem ICFEP. Quando excluídos esses pacientes da análise, houve redução significativa de mortalidade e hospitalização por IC no grupo das “Américas”. Embora análises post hocnão tenham a mesma força da evidência randomizada, alguns especialistas acreditam que a espironolactona possa ser indicada aos pacientes com ICFEP, especialmente naqueles com peptídeos natriuréticos muito elevados.

Opinião:

Como o benefício da espironolactona sobre mortalidade em ICFER não foi observado na população da Europa oriental, muitos especialistas argumentam que esses resultados do TOPCAT não podem ser aplicados à população em geral. De fato, como já falamos aqui na época da publicação do TOPCAT, o achado de resultados positivos em um subgrupo de um estudo cujo resultado original foi negativo é sempre limitado.

Entretanto, as diretrizes de IC americana e canadense (mas não a europeia) recomendam o uso de espironolactona em pacientes selecionados, com o objetivo de reduzir hospitalizações por ICFEP (recomendação fraca IIb). Dificilmente veremos uma diretriz assumindo a responsabilidade em se comprometer com uma recomendação de alguma droga, no caso a espironolactona, para redução de mortalidade baseando-se somente em uma análise post-hoc.

Na prática, os médicos das “Américas” devem estar cientes dessas variações regionais e considerar o uso da espironolactona em pacientes com ICFEP que atendam aos critérios do TOPCAT e das diretrizes. No entanto, até que novos estudos randomizados sejam publicados e confirmem essa hipótese, a indicação de espironolactona na ICFEP tem a mesma força de evidência que, por exemplo, o candesartan (CHARM-preserved) ou o perindopril (PEP-CHF). De qualquer forma, os iECA/BRAs, a espironolactona e os diuréticos permanecem sendo excelentes escolhas para o tratamento da hipertensão arterial sistêmica, presente em 80% dos pacientes com ICFEP.

NOTA: Mais informações sobre a eficácia e a segurança da espironolactona em doentes com ICFEP, e também da IC de fração de ejeção intermediária, devem ser apresentadas no estudo prospectivo randomizado SPIRRIT-HFPEF (n = 3.200), em andamento.

Pitt B, Ferreira JP, Zannad F. Mineralocorticoid receptor antagonists in patients with heart failure: current experience and future perspectives, European Heart Journal - Cardiovascular Pharmacotherapy, Volume 3, Issue 1, 1 January 2017, Pages 48–57.

Rossignol P, et al. Spironolactone and Resistant Hypertension in Heart Failure With Preserved Ejection Fraction, American Journal of Hypertension, Volume 31, Issue 4, 10 March 2018, Pages 407–14