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Uma nova perspectiva para o tratamento da desordem do desejo sexual hipoativo
Escrito por
Erik Trovao
Publicado em
14/2/2023
A desordem do desejo sexual hipoativo (DDSH) é uma condição frequente no mundo inteiro, afetando cerca de 10% dos homens e 8% das mulheres e levando a prejuízos na qualidade de vida e nas relações interpessoais. No entanto, ainda não dispomos de tratamento eficaz ou largamente disponível para o problema.
Em homens eugonádicos com disfunção sexual, a administração de testosterona não se mostrou eficaz. Em mulheres, a flibanserina e a bremelanotida têm eficácia limitada, enquanto os estudos com reposição de testosterona excluem, em sua maioria, mulheres na pré-menopausa e não há dados de segurança a longo prazo. Mas será que temos alguma perspectiva futura de tratamento para a DDSH?
Dois estudos, recentemente publicados no JAMA, apontam que sim. Ambos os estudos, um realizado em homens e o outro em mulheres, avaliaram um neuropeptídico, a kisspeptina, como possível terapia para a DDSH, encontrando resultados promissores.
A kisspeptina é um hormônio hipotalâmico fundamental para a ativação do eixo reprodutivo. Ele atua estimulando a secreção hipotalâmica de GnRH e tem sido apontado como fundamental para o início da puberdade. Mas estudos em modelos animais têm também apontado o seu papel na modulação do comportamento reprodutivo, incluindo a motivação sexual, a partir de ações extrahipotalâmicas.
Considerando que estudos funcionais de imagem têm evidenciado que homens e mulheres com desordem do desejo sexual hipoativo possuem hipoativação de regiões cerebrais relacionadas ao componente emocional (o que poderia influenciar negativamente o desejo sexual), hipotetizou-se que a administração de kisspeptina poderia ser efetiva para estes casos.
O primeiro estudo foi um ensaio clínico randomizado, duplo cego, que incluiu 32 homens com idade média de 37,9 anos. No grupo de intervenção, foi realizada infusão endovenosa de kisspeptina (1 nmol/Kg/h) por 75 minutos. Os desfechos analisados foram: atividade cerebral medida por imagem de ressonância magnética funcional em resposta a estímulo visual (vídeos eróticos) durante a infusão da kisspeptina ou do placebo; tumescência peniana; e medidas de desejo e excitação sexual.
Entre os resultados, observou-se que a kisspeptina modulou significativamente a atividade cerebral em áreas consideradas chave para o comportamento sexual. Além disso, houve aumento da tumescência peniana e da satisfação sexual.
O segundo estudo foi também um ensaio clínico randomizado, duplo cego, que incluiu 32 mulheres com idade média de 29,2 anos. O protocolo de intervenção foi o mesmo. Como resultado, a kisspeptina mostrou restauração do processamento cerebral sexual. Não foram relatados efeitos adversos em nenhum dos dois estudos.
A kisspeptina surge, então, como uma perspectiva futura para o tratamento da DDSH, mas é claro que precisamos aguardar dados de novos e maiores estudos para confirmar a eficácia e a segurança da droga.