Meu paciente descontinuou o denosumabe: e agora?

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O denosumabe é um anticorpo monoclonal que impede a ligação do RANKL ao receptor RANK nos precursores dos osteclastos, funcionando, assim, como um potente inibidor da osteoclastogênese. No estudo FREEDOM, sua eficácia em aumentar a densidade mineral óssea (DMO), suprimir os marcadores de remodelamento ósseo (MRO) e reduzir os riscos de fraturas vertebrais, não vertebrais e de quadril foi demonstrada em mulheres na pós-menopausa com osteoporose; todos estes benefícios associados a poucos efeitos adversos, a maioria relacionados a reações no local da aplicação subcutânea. No entanto, mesmo diante de tantas vantagens, uma característica da droga levanta um certo receio no momento da sua prescrição: o risco de fraturas vertebrais múltiplas de rebote associadas à descontinuação do denosumabe.

Afinal, este anti-reabsortivo, ao contrário dos bisfosfonatos, não possui efeito residual. Com cerca de 1 a 2 anos após a suspensão da medicação, a DMO retorna aos valores basais, mas, com 9 meses, os valores dos MRO já se encontram em níveis superiores aos vistos antes do início do tratamento, mostrando um provável rebote do turnover ósseo por um aumento da secreção de RANKL, agora livre do efeito inibidor.

Análises subsequentes do FREEDOM demonstraram que a prevalência de fraturas múltiplas de vértebras entre as participantes que descontinuaram o denosumabe era maior do que entre aquelas que descontinuaram o placebo (60,7% x 38,7%; p=0.049). A partir daí, surgiu a preocupação com qual seria a melhor conduta a ser tomada após a suspensão da medicação. Obviamente, o mais sensato seria iniciar alguma outra classe medicamentosa, especialmente algum bisfosfonato. Mas qual seria a melhor droga? Com que frequência e por quanto tempo manter seu uso? Qual o melhor momento para iniciá-la após a descontinuação do denosumabe?

Logo após a constatação de que alguma terapia alternativa deveria obrigatoriamente seguir o tratamento com denosumabe, muitos teorizaram que a infusão de uma dose única de zoledronato seria suficiente para minimizar a aumento do turnover ósseo e reduzir o risco de fraturas de rebote. Publicações subsequentes, no entanto, demonstraram que tal conduta não era suficiente para preservar a massa óssea em todos os casos, especialmente naqueles submetidos a uma terapia prolongada.

Aliás, o tempo de tratamento com denosumabe parece ser crucial no momento de escolher a terapia seguinte. Afinal, alguns estudos têm demonstrado que quando o tempo de tratamento é curto, uma dose única de zoledronato após a descontinuação parece ser eficaz em manter a massa óssea, com destaque para o estudo de Anastasilakis AD et al. Este demonstrou que, em mulheres tratadas com denosumabe por uma média de 2,2 anos, a infusão de uma dose única de zoledronato 6 meses após a suspensão preveniu a perda de massa óssea por no mínimo 2 anos, independente da taxa de turnover ósseo; mas os autores reforçaram que os dados não podiam ser extrapolados para a população geral.

Da mesma forma, o uso de alendronato também parece eficaz em mulheres que fizeram uso de denosumabe por até 2,5 anos. No estudo DAPS (Denosumab Adherence Preference Satisfaction), por exemplo, o grupo de mulheres que usaram alendronato por 1 ano após terem feito denosumabe por 12 meses, preservaram a massa óssea.

Por outro lado, quando o uso do denosumabe excede 2,5 anos, alguns estudos têm evidenciado menor efetividade de uma dose única de ácido zoledrônico em preservar a DMO. No estudo de Sølling AS et al, por exemplo, que avaliou 60 mulheres com tempo médio de uso do denosumabe de 4,6 anos, o grupo de pacientes que receberam uma dose única de zoledronato após a descontinuação, perderam DMO em todos os sítios após 12 meses. Esta perda foi mais acentuada quando a infusão foi feita após 9 meses da descontinuação do que após 6 meses.

Outro estudo demonstrou que, mesmo após uma queda dos MRO seguindo uma única infusão de zoledronato, os mesmos já voltavam a se elevar 3 meses depois, sugerindo que a monitorização trimestral dos mesmos poderia identificar os pacientes com maior risco de efeitos de rebote, individualizando melhor aqueles que necessitarão de uma nova dose de ácido zoledrônico.

Baseado nos dados apresentados acima, os autores de uma revisão sistemática publicada em outubro de 2020 no Journal of Clinical Endrocrinology & Metabology sugeriram uma conduta uniformizada baseando-se no tempo de tratamento com o denosumabe e na vigilância contínua dos níveis de CTX e da DMO:

  1. Em pacientes em tratamento com denosumabe por até 2,5 anos: iniciar bisfosfonato oral após 6 meses da descontinuação e manter seguimento com CTX a cada 3 meses ou a cada 6 meses após a estabilização (considerar estáveis níveis de CTX na metade inferior da normalidade para mulheres na pré-menopausa). Manter o bisfosfonato oral por 1 a 2 anos, exceto se o risco de fraturas ainda for alto (neste caso manter a medicação seguindo os critérios habituais para realizar o drug holiday).
  1. Em pacientes em tratamento com denosumabe há mais de 2,5 anos: fazer uma dose de zoledronato após 6 meses da descontinuação e seguir com dosagem de CTX após 3 e 6 meses. Se ainda altos, realizar nova infusão. Se níveis estáveis, não repetir a dose, mas persistir com a vigilância do CTX. Em caso de aumento, proceder uma nova infusão de ácido zoledrônico e assim sucessivamente sempre acompanhando os níveis de CTX para definir a conduta.

O tratamento sugerido acima pode servir como guia para os profissionais médicos que se deparam com o problema da descontinuação do denosumabe. No entanto, ainda são necessários mais ensaios clínicos randomizados que nos forneçam respostas definitivas não apenas sobre a melhor droga como também sobre o tempo ideal da terapia sequencial. Mas enquanto estas evidências não chegam, é preciso individualizar cada caso levando em conta tanto o tempo de tratamento prévio com o denosumabe quanto a evolução dos níveis séricos de CTX.