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Como deve ser o manejo clínico de adolescentes transgênero
Escrito por
Erik Trovao
Publicado em
10/10/2024
O surgimento dos caracteres sexuais secundários durante a puberdade está associado a aumento da disforia de gênero em adolescentes transgênero, de forma que a orientação atual é a de que seja realizado bloqueio puberal nestes jovens. Mas a partir de que idade devemos iniciar o bloqueio? E quando podemos começar a terapia hormonal de afirmação de gênero (THAG)c om estrógeno nas meninas e testosterona nos meninos?
O guideline da Endocrine Society fez várias recomendações sobre esta conduta em 2017, assim como a oitava versão do posicionamento da World Professional for Transgender Healt (WPATH) e um guideline italiano publicado agora em 2024. Todas estas diretrizes orientam o bloqueio puberal no início da puberdade seguido pela THAG com estradiol ou testosterona a partir dos 16 anos.
Importante ressaltar que todas as diretrizes concordam que não se deve iniciar qualquer tipo de intervenção hormonal durante a infância, período no qual, crianças com gênero diverso devem receber apenas acompanhamento psicológico e/ou psiquiátrico.
O bloqueio puberal deve ser iniciado apenas a partir de estágio 2 de desenvolvimento puberal, ou seja, assim que se identifica clinicamente o início da puberdade. O WPATH sugere, além do especificado, os seguintes critérios para início do bloqueio:
1. Diversidade/incongruência de gênero persistente e significativa ao longo do tempo.
2. Atender aos critérios para incongruência de gênero quando necessário para acessar cuidados de saúde.
3. Demonstrar maturidade emocional e cognitiva para consentimento/assentimento informado.
4. Ser informado sobre implicações reprodutivas, incluindo potencial perda de fertilidade.
O bloqueio puberal tem a vantagem de dar mais tempo para adolescente e familiares amadureceram as questões relacionadas ao gênero e previne mudanças físicas irreversíveis, como a modificação da voz naqueles que são biologicamente do sexo masculino e que poderiam agravar o sofrimento psicológico. Deve ser feito com análogos de GnRH (da mesma forma que é feito na puberdade precoce).
Algumas evidências têm mostrado os seguintes benefícios do bloqueio: a melhora da função psicológica e a redução de problemas emocionais e sintomas de depressão. Adultos que fizeram o bloqueio parecem também ter menos ideação suicida.
Já os dois principais riscos associados ao bloqueio são a infertilidade e a baixa massa óssea. Com o bloqueio no início da puberdade, não há estímulo para início da gametogênese, de forma que não há como garantir se a fertilidade será restaurada no futuro. O ideal, portanto, é oferecer ao adolescente, caso disponível, métodos de criopreservação do tecido gonadal (quando o bloqueio é iniciado no estágio 2) ou dos gametas (quando o bloqueio é iniciado em estágios posteriores).
Em relação à baixa massa óssea, sabemos que a puberdade é um período fundamental para que o indivíduo atinja o pico de massa óssea e o bloqueio causa redução da massa óssea durante a sua vigência. Embora algumas evidências indiquem que a THAG iniciada após o bloqueio restaure a massa óssea, este aumento parece ser incompleto especialmente em quem manteve o análogo de GnRH por mais de 2 anos. Portanto, é fundamental que medidas para preservação da massa óssea sejam tomadas neste período, como suplementação de cálcio e vitamina D e prática de atividade física.
Ao começar a THAG aos 16 anos, orienta-se que a dose de início do 17-beta-estradiol ou do éster de testosterona seja baixa, com aumentos progressivos a cada 6 meses até a dose de manutenção do adulto. O análogo de GnRH deve ser mantido durante este período de titulação, podendo ser suspenso ao se atingir a dose máxima da THAG. Alguns autores orientam que o análogo seja mantido até a realização da gonadectomia, caso esta seja desejável e viável.