Quando usar clomifeno no hipogonadismo masculino?

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O citrato de clomifeno é um SERM (Selective Estrogen Receptor Modulator) e, portanto, age no receptor estrogênico de forma diferente a depender do tecido: em alguns tecidos, ele é agonista estrogênico, enquanto, em outros, é antagonista. No eixo hipotalâmico/hipofisário, ele age de forma antagônica ao estradiol, de modo que ele é capaz de estimular a secreção hipofisária de gonadotrofinas tanto em homens quanto em mulheres.

Nos homens, para que a testosterona faça feedback negativo sobre a secreção de LH e FSH, é preciso que, antes, ela seja localmente aromatizada em estradiol. Desta forma, será a ativação do receptor estrogênico o responsável final pela inibição gonadotrófica. Assim, com a ação antagônica do clomifeno sobre a hipófise, teremos um aumento da secreção de FSH e LH, o que levará ao estímulo sobre a secreção testicular de testosterona e sobre a espermatogênese.

Percebe-se logo que o uso do clomifeno para tratamento do hipogonadismo masculino só faz sentido nas seguintes situações:

  1. No hipogonadismo hipogonadotrófico, já que é apenas neste tipo de hipogonadismo que o problema primário é a baixa secreção de FSH e LH.
  2. No hipogonadismo de causa funcional, já que, na presença de lesão estrutural, o bloqueio do feedback negativo sobre as células hipofisárias destruídas não surtirá nenhum efeito.

Conclui-se, portanto, que do ponto de vista teórico, a maior utilidade do clomifeno seria no hipogonadismo hipogonadotrófico funcional. No entanto, embora haja plausibilidade biológica neste uso e já existam estudos comprovando sua utilidade em várias destas situações, esta não é ainda uma indicação que conste em bula, de modo que o uso do clomifeno no tratamento do hipogonadismo masculino é ainda off label.

A grande preocupação é em relação à segurança a longo prazo, já que a maioria dos estudos ocorreram no período de alguns meses. No entanto, temos pelo menos um estudo que mostrou segurança do clomifeno com o seu uso por um período de 7 anos.

Mas em quais situações clínicas, devemos considerar o uso de clomifeno no homem? Abaixo, listamos as possíveis indicações:

  1. Homens com hipogonadismo hipogonotrófico comprovado, mas que desejam preservar a fertilidade a curto prazo: esta é uma indicação trazida pelo último guideline da Endocrine Society sobre o manejo do hipogonadismo masculino. Afinal, o uso de testosterona bloqueia ainda mais a espermatogênese, de forma que, se a infertilidade for um problema para o paciente, a terapia de reposição de testosterona (TRT) estaria contraindicada. Se, no entanto, for optado pelo clomifeno, este levará ao aumento da secreção hipofisária de gonadotrofinas que irão estimular diretamente os testículos a produzirem testosterona intratesticular que, por sua vez, estimulará a espermatogênese. Lembrado que, dificilmente, o clomifeno terá sucesso que houver lesão central estrutural.
  1. Recuperação do eixo gonadotrófico após abuso de esteroides anabolizantes: esta corresponde a uma das principais indicações clínicas do clomifeno na atualidade. Após a suspensão do esteroide anabolizante, o homem desenvolve hipogonadismo hipogonadotrófico funcional e o uso do clomifeno por alguns meses pode levar à restauração da secreção gonadotrófica e à reversão do quadro.
  1. Persistência do hipogonadismo após tratamento do prolactinoma com agonista dopaminérgico: sabemos que a hiperprolactinemia é causa funcional de hipogonadismo hipogonadotrófico que, portanto, costuma ser reversível com a normalização da prolactinemia. No entanto, em algums casos de prolactinoma, mesmo após sucesso da terapia com cabergolina, o homem persiste hipogonádico. Nesta situação, nos resta duas opções: iniciar TRT ou fazer uso de clomifeno (especialmente se a fertilidade for um problema).
  1. Hipogonadismo associado à obesidade: esta, talvez, seja ainda a mais discutível das possíveis indicações do clomifeno, por maior carência de evidências. No entanto, já temos algumas publicações considerando o uso nesta situação, desde que em situações específicas. A diretriz da Sociedade Brasileira de Diabetes, por exemplo, afirma que o citrato de clomifeno em indivíduos com diabetes mellitus tipo 2, síndrome metabólica ou obesidade deve ser considerado no tratamento do hipogonadismo principalmente no enfoque da preservação da fertilidade. Mas não podemos esquecer que o tratamento principal nestes casos é a própria perda de peso que, por si só, pode levar à resolução do quadro de hipogonadismo.

Percebemos, portanto, que, se bem indicado, o citrato de clomifeno possui algumas indicações específicas na prática clínica, especialmente naqueles pacientes que desejam preservar a fertilidade.

Porém, a preocupação com a segurança a longo prazo da droga ainda é real e precisamos de novos estudos por períodos maiores para melhor validação do seu uso nestes cenários clínicos. Desta forma, ao indicar clomifeno, devemos sempre avaliar os riscos e os benefícios, deixando claro, para o paciente, que o uso é ainda off label.