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Andar mais do que 7.000 passos por dia reduz risco cardiovascular?

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É mais do que conhecido o impacto positivo da atividade física sobre a saúde cardiovascular. Entre outros efeitos, o treinamento físico pode aumentar a tolerância à isquemia, melhorar a função endotelial e diminuir a reatividade plaquetária levando a uma menor propensão à trombose1,2,3. Todos estes efeitos somados podem resultar em redução substancial do risco de eventos cardiovasculares isquêmicos, além de promover o melhor controle dos fatores de risco, como hipertensão, síndrome metabólica e intolerância à glicose. Desse modo, as diretrizes atuais orientam um mínimo de 150 minutos por semana de atividade física aeróbia de moderada a alta intensidade, como classe I, no intuito de se prevenir a doença cardiovascular4. Pacientes com doença cardiovascular estabelecida também apresentam vários benefícios com a prática de atividade física.

Mas, será que existe alguma associação entre a quantidade de exercício mensurada por um acelerômetro, e menor mortalidade? Com o intuito de responder a esta pergunta, Paluch e cols. publicaram um interessante estudo no periódico JAMA Network Open5.

Os pesquisadores conduziram um estudo de coorte prospectivo que incluiu 2110 participantes com idade entre 38 e 50 anos, derivados do banco de dados do estudo CARDIA (Coronary Artery Risk Development in Young Adults), e seguidos por até 10 anos após a exposição de interesse. Os participantes usavam um acelerômetro, um dispositivo capaz de documentar a quantidade (passos/dia) e intensidade (passos/minuto) de caminhada ao longo do dia. Os pesquisadores encontraram uma associação entre caminhar ≥ 7.000 passos/dia e uma mortalidade 70% menor (hazard ratio 0,28; IC 95% 0,15-0,54) comparado a pessoas que caminhavam < 7.000 passos/dia. Aparentemente, caminhar > 10.000 passos/dia não se associou a benefício adicional. Como estes dados devem ser interpretados, e como eles influenciam em nossa prática clínica?

Antes de mais nada, o estudo deve ser interpretado à luz de diversas limitações. Em primeiro lugar, o fato de ser um estudo de coorte observacional não randomizado não permite inferir causalidade, mas apenas associação. Muitos fatores de confundimento (doenças associadas, idade, outros hábitos de vida) poderiam explicar tal associação e não apenas a quantidade de passos em si. O fato de a magnitude de efeito ser muito grande também corrobora tal potencial explicação (uma redução de 70% em mortalidade com uma intervenção comportamental é extremamente inesperada e até biologicamente implausível em medicina). Um segundo ponto (apesar de os pesquisadores terem tentado ajustar para isso) foi que o estudo pode ter apresentado também um viés de causalidade reversa. Tal situação ocorre quando a exposição é na verdade o efeito, e não a causa, de um determinado segundo fator que tem o real elo causal com a mortalidade. Por exemplo, uma pessoa que fique doente com mais frequência ou que tenha alguma comorbidade tenderá a caminhar menos. A maior mortalidade neste caso não será devido ao fato de se exercitar menos, e sim à doença que diminuiu a capacidade de exercício do indivíduo, resultando numa associação espúria (“Morre mais porque caminha menos, ou caminha menos porque tem uma doença que faz morrer mais?”). Em terceiro lugar, pessoas que aderem ao dispositivo de mensuração de passos e providenciam uma informação adequada têm mais probabilidade de serem saudáveis, de tal maneira que os resultados do estudo são pouco generalizáveis a uma população geral de pessoas do mesmo sexo e idade. Isso é exemplificado pela prevalência muito baixa de hipertensão (< 20%) e diabetes (< 10%) nessa coorte.

Apesar de todas estas limitações, o estudo traz uma mensagem importante para o clínico. Não importa se o paciente desempenhe alguma atividade física estruturada (corrida, natação, etc), o que importa provavelmente é a quantidade de exercício aeróbio global ao longo do dia. Segundo, mesmo pequenos incrementos podem gerar grandes mudanças. Isso é corroborado por diversos estudos prévios mostrando que o ganho de saúde é maior ao se mudar de um estado sedentário para atividade física leve-moderada, do que de moderada para intensa6. Portanto, podemos falar ao nosso paciente que quanto mais ele(a) caminhar menor é a probabilidade de sofrer um problema cardiovascular, tanto faz se for passear com o cão, andar e subir escadas no trabalho, ou mesmo andar pela vizinhança apreciando a paisagem.

REFERÊNCIAS

  1. Thompson PD: Exercise prescription and proscription for patients with coronary artery disease. Circulation 2005; 112:2354.
  2. Gielen S, Schuler G, Adams V: Cardiovascular effects of exercise training: Molecular mechanisms. Circulation 2010; 122:1221.
  3. Wang JS, Jen CJ, Chen HI. Effects of exercise training and deconditioning on platelet function in men. Arterioscler Thromb Vasc Biol. 1995; 15(10):1668-74.
  4. Arnett DK, Blumenthal RS, Albert MA, Buroker AB, Goldberger ZD, Hahn EJ, Himmelfarb CD, Khera A, Lloyd-Jones D, McEvoy JW, Michos ED, Miedema MD, Muñoz D, Smith SC Jr, Virani SS, Williams KA Sr, Yeboah J, Ziaeian B. 2019 ACC/AHA Guideline on the Primary Prevention of Cardiovascular Disease: Executive Summary: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Clinical Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. 2019; 74(10):1376-1414.
  5. Paluch AE, Gabriel KP, Fulton JE, Lewis CE, Schreiner PJ, Sternfeld B, Sidney S, Siddique J, Whitaker KM, Carnethon MR. Steps per Day and All-Cause Mortality in Middle-aged Adults in the Coronary Artery Risk Development in Young Adults Study. JAMA Netw Open. 2021; 4(9):e2124516.
  6. Sattelmair J, Pertman J, Ding EL, et al: Dose response between physical activity and risk of coronary heart disease: A meta-analysis. Circulation 2011; 124:789.