Dor pélvica crônica

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A dor pélvica crônica, comum na menacme, não é conhecida como doença, mas sim um sintoma deflagrado por inúmeras condições. Possui uma grande prevalência podendo chegar a 60% das mulheres, quando consideradas afecções ginecológicas e não ginecológicas. Essa manifestação traz um impacto considerável na saúde e qualidade de vida das mulheres, além de estar associada à depressão, ansiedade, piora do desempenho laboral e diminuição da satisfação sexual. É considerada uma síndrome (Síndrome da Dor Pélvica Crônica – SDPC), quando não há comprovação de doença e possui como consequência alteração comportamental, cognitiva, sexual, emocional associada à disfunção do assoalho pélvico.

É definida pela ACOG, conforme algia percebida por mais de seis meses na região pélvica que pode ser cíclica ou acíclica, mas também possui como definição sofrimento de três a seis meses de forma não cíclica e não relacionada à gestação. A dor cíclica, para ser considerada DPC, deve ter, assim como a dor acíclica, consequências negativas quanto à cognição, comportamento, saúde sexual. Devido ao padecimento, muitas mulheres são submetidas à histerectomia, laparoscopia, e a dor corresponde até 20% das queixas das consultas ginecológicas. Possui uma alta taxa de recorrência quando tratada, até 33% dos casos, e pode não estar localizada apenas na pelve, mas com irradiação para outros locais.

As etiologias mais comuns são: algias musculoesquelética ou do assoalho pélvico, síndrome do intestino irritável, síndrome de dor na bexiga ou cistite intersticial, distúrbios de dor uterina crônica como miomatose, endometriose, adenomiose e neuropatia periférica.

Pode ser um sintoma de fatores identificáveis, como a endometriose ou síndromes de dor funcional conforme síndrome do intestino irritável, aderências, musculoesquelética. Em pacientes que não há uma causa identificável, enquadram-se em dor somática funcional em que há uma percepção aumentada do sofrimento.

Devido a ampla gama dos diferenciais, categoriza-se a cólica em consternação de origem visceral, neuromuscular e psicossocial de modo a ser mais efetivo quanto à programação terapêutica. As dores de origem ginecológica incluem adenomiose, aderências, congestão pélvica, doença inflamatória pélvica crônica, endometriose, miomatose, ovário remanescente, massas anexiais, vestibulite, vulvodínia e esses motivos são consideradas viscerais. Há, porém, outras razões de algias viscerais como síndrome do intestino irritável, doenças inflamatórias intestinais, colite, doença celíaca, neoplasia, além das causas urinárias. As urinárias podem ser a síndrome da bexiga dolorosa, infecção urinária permanente ou complicada, divertículo uretral, neoplasia.

Quando um sofrimento é considerado visceral, possui a característica de ser difuso, com pouca precisão, em cólica e frequentemente possuem, em conjunto, ocorrências como: mal-estar, náusea, sudorese e palidez conhecidos pelos sintomas autonômicos. A imprecisão da dor, nesse caso, vem do fato de que os nociceptores da parede das vísceras deflagram o estímulo via fibras tipo C. Podem ser estimulados por distensão visceral, inflamação ou aumento da contração visceral.

As neuromusculares são dores mais precisas, bem delimitadas, possuem geralmente ponto gatilho, não possuem fenômenos autonômicos associados. Podem estar relacionadas a cirurgias prévias ou até inflamação na região. Podem ser associados à dor, hipo ou hiperestesia em dermátomo, além de queixa de algia em queimação. Geralmente, são provenientes de estruturas somáticas como fáscia, músculo, tendão que deflagram o estímulo por fibras do tipo A, que possuem resposta mais localizada do estímulo.

As dores neurológicas, por sua vez, são consequência de dano, seja ele inflamação ou compressão direto na fibra. Essa desregulação de excitabilidade neuronal ocasiona sintomas associados: alteração da sensibilidade do dermátomo, visto que as fibras neuronais são agrupadas, levando à medula, estímulos diversos.

As dores deflagradas por fatores psicossociais podem estar presentes em qualquer tipo de dor e seu diagnóstico será de exclusão. Podem estar associadas na alteração da fisiologia das estruturas supratalâmicas que são responsáveis pela percepção dolorosa.

Algumas ocorrências devem ser avaliados com cautela, independente da etiologia da dor como manifestações que surgiram e progrediram rapidamente, manifestações em mulheres acima de 50 anos, perda de peso associado, massas pélvicas volumosas, hematoquezia, hematúria, exposição à rádio ou a quimioterápicos e sintomas depressivos graves associados, como ideação suicida.

Independente da etiologia da dor, a sensibilização central ocorre em portadoras de dor crônica que é devido à diminuição do limiar de percepção da dor. O sofrimento tem, por origem, função de alerta, mas a cronicidade desse sintoma resulta em rearranjos do SNC facilitando sua via mantendo a percepção dolorosa. Há uma arborização na medula espinal dos aferentes viscerais penetrando em vários segmentos espinhais ativando de forma ampla e difusa o sistema nervoso central. Associado a isso, há o envolvimento de estruturas supraespinhais, que são relacionadas a reflexos autonômicos e motores que podem deflagrar sintomas como náusea, ocorrências intestinais e urinários associados, aumento da tensão muscular. Assim, a paciente possui uma percepção aumentada da dor.

Na avaliação clínica, é importante sistematizar a anamnese levando em consideração tratamentos realizados, exame físico e formulários padronizados como Pelvic Pain Society. A avaliação cronológica é necessária, bem como histórico de cirurgia prévia, interrogação ativa de histórico de violência sexual, além de mensurar a intensidade da dor. Dessa forma, a longo prazo, pode-se avaliar o sucesso ou fracasso terapêutico. Há um mnemônico utilizado durante a anamnese que pode auxiliar que é APQRST em que se avalia sintomas associados, provocativo, qualidade, radiação, cenário, aspectos temporais. O diagnóstico da causa da dor crônica é desafiador, visto que pode ocorrer mais de uma causa subjacente.