Compartilhe
Diagnóstico por imagem do sangramento uterino anormal
Escrito por
Dra. Patricia Peras
Publicado em
6/11/2023
O sangramento uterino anormal ocorre quando um dos parâmetros menstruais se encontra alterado, seja a frequência, o volume, a periodicidade ou a regularidade. Para o diagnóstico, é importante a diferenciação de causas estruturais e não estruturais. Entre as causas estruturais, ou seja, aquelas que ocorrem devido à alteração da estrutura uterina, há o mnemônico PALM, podendo ser pólipo, adenomiose, leiomiomas e malignidade, que podem ser identificados através de exames de imagem. Já nas causas não estruturais, ou seja, quando a estrutura do útero não possui alteração, sendo necessária avaliação de outra etiologia, há o mnemônico COEIN, em que se investiga coagulopatia, disfunção ovulatória, causas endometriais, iatrogênicas e as não classificadas.
Nesse aspecto, os exames de imagem auxiliam no diagnóstico diferencial e na caracterização da etiologia do sangramento, uma vez que possuem altas taxas de acurácia para identificar causas estruturais; já, entre as não estruturais, auxiliam no diagnóstico de disfunção ovulatória, como na Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP) e nas não classificadas.
Os pólipos estão entre as causas mais comuns de sangramento uterino anormal. Ocorrem devido a um crescimento de estroma e glândulas endometriais, circundados por vasos sanguíneos que podem ocasionar desde episódios de sangramento intenso até achados ocasionais em pacientes assintomáticas. Tendem a expandir sua prevalência com o aumento da idade e raramente (até 5%) são malignos. Para a identificação dessa lesão, a ecografia transvaginal é o exame de primeira escolha. Nesse exame, é possível identificar o pólipo através de formação ecogênica precisa no interior da cavidade. Realizado na primeira fase do ciclo, para melhorar as taxas de falsos positivos e negativo, o Doppler pode ser de grande valia quando identifica o pedículo vascular dessa estrutura. Além do Doppler, pode realizar a infusão de solução salina, em que há um aumento do contraste ultrassonográfico, aumentando ainda mais a acurácia do exame. Outros exames de imagem também podem ser úteis no diagnóstico dessa patologia, como a Histerossalpingografia (HSG), geralmente é solicitada por outro motivo, e a histeroscopia com biópsia dirigida, que, atualmente, é o padrão-ouro no diagnóstico.
A adenomiose – em que glândula e estroma endometrial penetram no miométrio de forma difusa ou localizada na parede do miométrio – pode acometer de 5 a 70% das mulheres com sangramento uterino aumentado. Para a identificação, a ultrassonografia também é primeira linha, evidenciando aumento do volume uterino, assimetria da espessura entre as paredes do útero, miométrio de aspecto heterogêneo, estrias ecogênicas, nódulos ecogênicos subendometriais, perda da definição da zona juncional. O Doppler pode auxiliar na diferenciação de adenomiose e leiomiomas. Na histerossonografia, um exame que instila salina estéril na cavidade uterina, pode ser observado uma continuidade entre os espaços císticos subendometriais em divertículos, cujas formas lembram uma chama ou um pirulito (lollipop like diverticula). A ressonância possui papel complementar nesse diagnóstico e os achados são relacionados à perda da zona juncional, podendo revelar sinais de hipertrofia de células musculares lisas que indicam a invasão de glândulas endometriais no miométrio. Já a histeroscopia pode visualizar sinais endometriais como hipervascularização endometrial, defeito endometrial e até cistos submucosos hemorrágicos.
Os leiomiomas, que são tumorações benignas que ocorrem em até 70% das mulheres na menacma, geralmente possuem sintomas relacionados ao tamanho, formato e localização. A ecografia também consiste no exame de primeira linha para o seu diagnóstico, aparecendo como tumoração sólida, de bordos regulares, hipoecogênico e heterogêneo e podem conter, ao seu redor, fluxo detectável ao Doppler. A infusão salina, nos casos de miomas submucosos, possui a mesma taxa de detecção que a ultrassonografia, não sendo vantajosa como nos pólipos e adenomiose. A ressonância magnética pode auxiliar no diagnóstico e na programação de cirurgia.
Nos casos de malignidade, a imagem não faz o seu diagnóstico, porém, nos casos com fatores de risco, o exame pode auxiliar na suspeita e então prosseguir com conduta para avaliação histológica, uma vez que o sintoma mais comum de câncer de endométrio é o sangramento.
Nas disfunções ovulatórias, como a SOP, endocrinopatia mais comum na menacma, a ecografia auxilia no diagnóstico através do critério ultrassonográfico descrito no Consenso de Rotterdam e AE-PCOS. Assim, a ecografia pode avaliar o ovário que apresenta 20 ou mais folículos, de 2 a 9 mm ou volume ovariano acima de 10 cm³, na ausência de cisto funcional. Outras condições como as não classificadas, que incluem istmocele e Malformação Arteriovenosa (MAV), podem ser suspeitadas com exames de imagem.
REFERÊNCIAS:
HARMSEN, M.J. et al. Consensus on revised definitions of Morphological Uterus Sonographic Assessment (MUSA) features of adenomyosis: results of modified Delphi procedure. Ultrasound Obstetrics Gynecology, v. 60, n. 1, 2022, p. 118-131. Disponível em: https://doi.org/10.1002/uog.24786. Acesso em: 30 out. 2023.
KIM, Kyu-Rae et al. A diagnostically useful histopathologic feature of endometrial polyp: the long axis of endometrial glands arranged parallel to surface epithelium. The American Journal of Surgical Pathology, v. 28, n. 8, 2004, p. 1057-1062. Disponível em: https://doi.org/10.1097/01.pas.0000128659.73944.f3 Acesso em: 30 out. 2023.
MUTTER, George; NUCCI, Marisa; ROBBOY, Stanley. Endometritis, metaplasias, polyps, and miscellaneous changes. In. ROBBOY, Stanley et al (eds). Robboy's Pathology of the Female Reproductive Tract. 2. ed. Oxford: Churchill Livingston Elsevier, 2009. p. 343.
SIMÕES, Ricardo dos Santos et al. Importância do diagnóstico por imagem em pacientes com sangramento uterino anormal. Feminina, v. 51, n. 8, 2023, p. 455-461. Disponível em: https://www.febrasgo.org.br/media/k2/attachments/Femina_8_2023.pdf. Acesso em: 30 out. 2023.