Terapia Hormonal em Mulheres com Lipedema: Há Risco Aumentado ou Mito?

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O lipedema, uma condição crônica frequentemente mal compreendida, afeta milhões de mulheres e é caracterizado pela deposição anormal de gordura subcutânea, principalmente nas extremidades inferiores. Uma dúvida comum entre ginecologistas e cirurgiões que tratam essas pacientes é o impacto da terapia hormonal (TH) — seja ela contraceptiva ou de reposição hormonal — no curso da doença. A associação entre hormônios e o agravamento do lipedema é frequentemente discutida, mas as evidências para sustentar essa relação permanecem limitadas e controversas.

Terapia Hormonal e Lipedema: O Que as Evidências Mostram?

Estudos sobre o lipedema ainda são escassos, o que complica a análise do efeito de intervenções hormonais. No entanto, há algumas questões-chave a serem discutidas com base na fisiopatologia do lipedema e nos efeitos conhecidos dos hormônios sexuais.

Estrogênio e Progressão do Lipedema

Muitas pacientes relatam o início ou a piora dos sintomas do lipedema em momentos de grandes mudanças hormonais, como a puberdade, gestação e menopausa. Isso levou à hipótese de que o estrogênio poderia ter um papel na regulação do tecido adiposo subcutâneo nas mulheres com lipedema. Entretanto, os estudos clínicos ainda não provaram de forma conclusiva que a administração exógena de estrogênio (seja em anticoncepcionais combinados ou na reposição hormonal) exacerba a condição.

  • Contraceptivos Orais Combinados (COC): Não há evidência robusta que sugira que o uso de COC agrave o lipedema de maneira significativa. Algumas pacientes podem relatar aumento de retenção hídrica, o que pode ser confundido com a progressão do lipedema, mas esse efeito é temporário e não está diretamente relacionado à deposição anômala de gordura.
  • Reposição Hormonal (TH): Mulheres na menopausa com lipedema frequentemente enfrentam a dúvida se a TH com estrogênio pode exacerbar a condição. Os dados disponíveis sugerem que a reposição com estrogênio, principalmente quando combinada com progesterona, não agrava a progressão do lipedema. Entretanto, é importante considerar as necessidades individuais e sintomas relacionados, como a qualidade de vida e controle da dor.

O Papel do Progestágeno

Muitas pacientes com lipedema recebem progestágenos isolados, como no caso do DIU hormonal ou pílulas de progesterona, seja para tratamento contraceptivo ou manejo de condições como endometriose e menorragia. Estudos sugerem que a progesterona tem menor impacto no tecido adiposo subcutâneo comparada ao estrogênio, sendo, portanto, uma opção mais segura para mulheres com lipedema que precisam de anticoncepção hormonal.

Terapias Alternativas: O DIU de Cobre como Solução?

Para aquelas pacientes que preferem evitar hormônios devido à percepção (ainda que muitas vezes não baseada em evidências concretas) de que esses possam agravar o lipedema, o DIU de cobre surge como uma alternativa eficaz e sem impacto hormonal direto. Além de evitar potenciais efeitos de retenção hídrica ou ganho de peso, essa opção é amplamente considerada segura para mulheres com lipedema.

Lidando com Mitos e Realidades: Fatores a Considerar

Muitos dos receios que cercam a terapia hormonal em pacientes com lipedema são alimentados por uma combinação de evidências limitadas e relatos anedóticos. Fatores como alimentação inadequada, falta de atividade física e predisposição genética têm um impacto mais direto na progressão do lipedema do que o uso de hormônios.

  • Educação da Paciente: É fundamental esclarecer às pacientes que o ganho de peso e a progressão do lipedema não são inevitáveis com o uso de hormônios. Um acompanhamento multidisciplinar, que inclua especialistas em vascular, nutrição e endocrinologia, pode auxiliar no manejo integral da condição.
  • Monitoramento Regular: Pacientes com lipedema que utilizam terapia hormonal devem ser monitoradas quanto a quaisquer sinais de retenção de líquidos ou agravamento dos sintomas. Alterações na dosagem ou tipo de hormônio podem ser feitas conforme necessário, sempre buscando o equilíbrio entre controle dos sintomas e minimização de riscos.

Apesar das preocupações levantadas sobre a terapia hormonal em pacientes com lipedema, as evidências científicas atuais não suportam uma relação direta entre o uso de hormônios e a piora significativa da condição. A escolha do método hormonal deve ser individualizada, levando em conta os sintomas da paciente, seu histórico médico e a necessidade de um controle adequado da contracepção ou dos sintomas da menopausa. É necessário um acompanhamento contínuo e multidisciplinar, focado em minimizar os riscos e maximizar a qualidade de vida dessas mulheres.