Doença inflamatória pélvica – uma condição ainda subdiagnosticada e subtratada

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A doença inflamatória pélvica (DIP) é um processo inflamatório no sistema reprodutor feminino causado por germes ascendentes provenientes da vagina. Os principais agentes causadores são a Neisseria gonorrhoae e a Chlamydia trachomatis. Vários outros patógenos também podem estar envolvidos, como a Gardnerella vaginalis e a própria Escherichia coli. Algumas vezes esses agentes conseguem ultrapassar a barreira protetora do muco cervical e ascender através da endocérvice, promovendo um processo inflamatório no útero, tubas e superfície peritoneal.

As pacientes costumam apresentar queixa de dor em baixo ventre, leucorreia e/ou dispareunia de profundidade. Febre e sintomas urinários também podem estar presentes. Ao exame físico a paciente apresenta dor à palpação da região hipogástrica e à palpação dos anexos. O exame especular pode evidenciar cervicite purulenta e o toque vaginal demonstra dor à mobilização (ou à báscula) do colo uterino. Este último achado do exame físico, particularmente, tem associação íntima com o quadro clínico de DIP. É fundamental que os médicos que prestam a assistência às pacientes com sintomas sugestivos desta patologia realizem o toque vaginal com a mobilização do colo. Os critérios diagnósticos são alocados no quadro 1. A definição diagnóstica é estabelecida na presença de três critérios maiores e um menor, ou apenas um dos critérios elaborados.

CRITÉRIOS MAIORES

  • dor hipogástrica
  • dor à palpação dos anexos uterinos
  • dor à mobilização (báscula) do colo uterino

CRITÉRIOS MENORES

  • temperatura axilar > 37,5°C ou temperatura retal > 38,3°C
  • conteúdo vaginal ou secreção endocervical anormal
  • massa pélvica
  • mais de 10 leucócitos por campo de imersão em material de endocérvice
  • leucocitose em sangue periférico
  • proteína C reativa ou velocidade de hemossedimentação aumentadas
  • comprovação laboratorial de infecção cervical por agente causador de DIP

CRITÉRIOS ELABORADOS

  • evidência histopatológica de endometrite
  • presença de abscesso tubo-ovariano ou de fundo de saco de Douglas em estudo de imagem
  • laparoscopia com evidência de DIP

Quadro 1 – critérios diagnósticos de DIP

Apesar de existirem critérios academicamente estabelecidos, a dificuldade na aplicação prática destes muitas vezes pode atrasar o diagnóstico e o tratamento. Portanto, recomenda-se o tratamento diante da suspeita clínica. O esquema de antibioticoterapia recomendado é ceftriaxona 500 mg intramuscular em dose única associada a doxiciclina 100 mg por via oral a cada 12 horas por 14 dias e, ainda, metronidazol 500 mg por via oral a cada 12 horas por 14 dias. A(s) parceria(s) sexual(is) deve(m) ser igualmente tratada(s). Entretanto, existem as situações em que a internação hospitalar é recomendada (tabela 2).

Estado geral grave com náuseas, vômitos e/ou febreSuspeita de abscesso tubo-ovarianoGestantesPossibilidade de outro diagnóstico (apendicite ou gestação ectópica por exemplo)Intolerância aos antibióticos por via oralFalha no tratamento ambulatorial (após 48 a 72 horas)

Quadro 2 – Indicações de tratamento hospitalar em pacientes com DIP

Nos cenários em que a internação hospitalar é recomendada a primeira opção é a ceftriaxona endovenosa associada à doxiciclina por via oral e ao metronidazol também por via endovenosa. Outra opção é o tratamento de associação de clindamicina e gentamicina.

A DIP ainda é uma patologia subdiagnosticada e subtratada no Brasil. A evidência é a prevalência ainda alta de sequelas tardias como infertilidade por obstrução tubária, dor pélvica crônica e síndrome de Fitz-Hugh-Curtis (inflamação na cápsula de Glisson). O diagnóstico e o tratamento precoces são fundamentais para a redução dos casos graves e das sequelas tardias.

Referências

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST). Brasília: Ministério da Saúde, 2020.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Prevenção da Transmissão Vertical do HIV, Sífilis e Hepatites Virais. Brasília: Ministério da Saúde, 2022.